quinta-feira, 25 de abril de 2024

BUSCAR CONSOLAÇÃO SOMENTE EM DEUS

 

Para que queres ver o que não te é lícito possuir? Passa o mundo e a sua concupiscência. A inclinação sensual convida a passeios; passada, porém, àquela hora, que nos fica senão consciência pesada e coração distraído? À saída alegre, muitas vezes sucede um regresso triste, e à véspera deleitosa uma triste manhã. Assim, todo gosto carnal entra suavemente; no fim, porém, remorde e mata. Que poderás ver alhures que aqui não vejas? Eis: aqui tens o céu, a terra e todos os elementos; e deles são feitas todas as coisas.

Que poderás ver, em parte alguma, estável debaixo do sol por muito tempo? Pensas talvez te satisfazer completamente? Pois não o conseguirás. Se visses diante de ti todas as coisas, que seria senão vã fantasia? Levanta os olhos a Deus nas alturas e pede perdão de teus pecados e negligências. Deixa as vaidades para os fúteis; tu, porém, atende ao que Deus te manda. Fecha atrás de ti a porta e chama a teu Jesus amado. Fica-te com ele em tua cela, porque tanta paz em outra parte não acharás. Se não tivesses saído, e escutado os rumores do mundo, melhor terias conservado a santa paz; enquanto folgares de ouvir novidades, terás que sofrer desassossego do coração.

...

Quando o homem chega ao ponto de não buscar sua consolação em nenhuma criatura, só então começa a gostar perfeitamente de Deus, e anda contente, aconteça o que acontecer. Então não se alegra pela abundância, nem se entristece pela penúria, mas confia inteira e fielmente em Deus, que lhe é tudo em todas as coisas, para quem nada perece nem morre, mas por quem vivem todas as coisas e a cujo aceno, com prontidão, obedecem.

Lembra-te sempre do fim, e que o tempo perdido não volta. Sem empenho e diligência, jamais alcançarás as virtudes. Se começares a ser tíbio, logo te inquietarás. Se, porém, procurares afervorar-te, acharás grande paz e sentirás mais leve o trabalho com a graça de Deus e o amor da virtude. O homem fervoroso e diligente está preparado para tudo. Mais penoso é resistir aos vícios e às paixões que afadigar-se em trabalhos corporais. Quem não evita os pequenos defeitos pouco a pouco cai nos grandes. Alegrar-te-ás sempre à noite, se tiveres empregado bem o dia. Vigia sobre ti, anima-te e admoesta-te e, vivam os outros como vivem, não te descuides de ti mesmo. Tanto mais aproveitarás, quanto maior for a violência que te fizeres. Amém.

(Da Imitação de Cristo, de Thomas de Kempis)

quarta-feira, 24 de abril de 2024

TESOURO DE EXEMPLOS (321/325)

 

321. UMA SÓ BOCA

Zenão, estando em companhia de um jovem que falava demais, disse-lhe: 'Fica sabendo que temos dois ouvidos e uma só boca, para escutarmos duas vezes mais do que falamos'.

322. GUARDANDO SILÊNCIO

Alguém perguntou a Pitágoras como poderia chegar a ser seu discípulo. O filósofo respondeu: 'Guardando silêncio até que seja necessário falar; não dizendo senão o que sabeis bem; fazendo o maior bem possível e falando pouco, porque o silêncio é sinal de prudência e a tagarelice é sinal de tolice. Não vos apresseis a responder, e deixai que aquele que pergunta acabe de falar. Não faleis mal de ninguém'. Costumava condenar seus discípulos a cinco anos de silêncio.

323. ADULAÇÃO EXAGERADA

Alexandre Magno atravessava um grande rio numa barca em companhia de Aristóbulo. Este, durante a travessia, pôs-se a ler em alta voz a história do conquistador, mesclada com elogios de uma adulação exagerada. Alexandre tomou o livro e atirou-o ao rio, dizendo que o autor merecia a mesma sorte, por ser mais culpado que os seus escritos.

324. NÃO RESPONDEREI

Um dia estava Metelo a falar mal de Tácito, que, ouvindo-o, disse-lhe: 'Podes falar como te aprouver, porque eu não responderei. Se aprendeste a falar mal, eu aprendi a desprezar a maledicência'.

325. DIANTE DE UM QUIOSQUE

Regressava Dom Bosco ao oratório numa tarde de 1851. Ao passar diante de um quiosque, parou para olhar os livros. O vendedor então lhe disse:
➖ Esses livros não servem para o senhor porque são todos protestantes.
➖ Estou vendo - disse-lhe o santo - mas, na hora da morte, estará o senhor tranquilo, depois de haver vendido tais livros e haver propagado o erro?

Ditas estas palavras, saudou-o e retirou-se. O vendedor perguntou quem era aquele sacerdote e, ao saber que era Dom Bosco, tratou de conversar com ele. Em seguida, levou-lhe todos os livros para serem queimados e, dali em diante, seguiu sempre o bom caminho.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)

terça-feira, 23 de abril de 2024

FRASES DE SENDARIUM (XXVIII)

'Para Deus, vale mais uma hora de paciência que o jejum de um dia inteiro' 
(Dom Bosco)

'Portanto, como eleitos de Deus, santos e queridos, revesti-vos de entra­nhada misericórdia, de bondade, humildade, doçura e paciência' (Cl 3,12)

segunda-feira, 22 de abril de 2024

SOBRE A VIRTUDE CRISTÃ DA ESPERANÇA

Rezo para que, nesta Páscoa, o Senhor repita aos seus amigos: 'Por que estás tão deprimido, tão desanimado e por que está o teu coração perturbado?' Pois digo então a vós: Regozijai-vos porque há trevas e perseguição no mundo. Alegrai-vos porque há trevas e perseguições no mundo. Não disse o Mestre que, como o perseguiram, assim perseguiriam os seus seguidores? Teremos perdido a virtude cristã da esperança? Por que razão a nossa conduta deveria ser diferente daquela dos cristãos do primeiro século da nossa era? Também eles olhavam o mundo com desconfiança, esperando o seu fim a qualquer momento, precedido da vinda de Jesus Cristo e do julgamento. Mas aguardavam-no com coragem; procuravam as coisas mais altas com fé na Ressurreição.

Hoje, pelo contrário, há uma maioria de pessoas que procuram mais a segurança do que a felicidade na Ressurreição. Eles são, ou nós somos, como aqueles que, numa viagem marítima, se preocupam mais com o colete salva-vidas do que com a beleza do mar ou que, numa viagem aérea, se interessam mais pelo pára-quedas do que pela beleza do céu de Deus... Mas digamos com São Paulo: 'Se Cristo não ressuscitou, somos os mais miseráveis do mundo'. Como podemos acreditar que Deus reserva aos seus inimigos todas as satisfações e alegrias, e aos seus filhos todas as dores e sofrimentos? 

Estamos condenados a dependurar os braços nos salgueiros chorosos, a cantar apenas lamentações tristes, enquanto os filhos de Satanás riem e triunfam? Não! Vamos até Deus e o chamemos de 'Pai', como seus filhos por adoção, o que não é o mesmo que por escravidão. Não tenhamos medo! Estejamos plenamente convencidos de que Aquele que entrou no túmulo era a própria Verdade e que a Verdade, pisoteada, ressuscitará irresistivelmente... Que aqueles que acreditam na Ressurreição não percam o ânimo! Lembrem-se de que a Igreja, tal como Jesus, não só tem uma vida contínua, como também sobreviveu a milhares de crucificações e a outras tantas ressurreições... 

Não desanimeis! Lembrai-vos de que o vosso Rei, embora pareça ausente por vezes ao conceder ao mal as suas horas, vence sempre a competição. Dizei então como São Paulo: 'A tribulação ou a angústia? A fome, a nudez, os perigos, a perseguição, a espada? Estou persuadido de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as virtudes, nem o presente, nem o futuro, nem as potestades, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer criatura nos poderá separar do amor de Deus em Cristo Jesus, nosso Senhor'.

(Venerável Fulton Sheen)

domingo, 21 de abril de 2024

EVANGELHO DO DOMINGO

 

'A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se agora a pedra angular' (Sl 117)

Primeira Leitura (At 4, 8-12) - Segunda Leitura (1Jo 3,1-2) -  Evangelho (Jo 10,11-18)

  21/04/2024 - QUARTO DOMINGO DA PÁSCOA

21. O BOM PASTOR


No Quarto Domingo da Páscoa, Jesus se apresenta como o Bom Pastor: 'Eu sou o bom pastor. O bom pastor dá a vida por suas ovelhas' (Jo 10, 11). Jesus acabara de curar um cego de nascença e os fariseus o condenavam por ter praticado um milagre tão extraordinário num sábado. Mas o cego, superando a obstinação, a hipocrisia e as ameaças daqueles homens, não apenas viera reencontrar Jesus mas, como ovelha do Bom Pastor, prostrou-se diante dele e o adorou. Diante da multidão perplexa por estes fatos, Jesus projeta no cego curado as ovelhas do seu rebanho, e se apresenta como o Bom Pastor que acolhe as suas ovelhas com doçura extrema e infinita misericórdia, e que é capaz de dar a sua vida por elas.

Jesus, o Bom Pastor, conhece e ama, com profunda misericórdia, cada uma de suas ovelhas desde toda a eternidade: 'Eu sou o bom pastor. Conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem, assim como o Pai me conhece e eu conheço o Pai. Eu dou minha vida pelas ovelhas' (Jo 10, 14 - 15). Nada, nem coisa, nem homem, nem demônio algum, poderá nos apartar do amor de Deus. Porque este amor, sendo infinito, extrapola a nossa condição humana e assume dimensões imensuráveis. Ainda que todos os homens perecessem e a humanidade inteira ficasse reduzida a um único homem, Deus não poderia amá-lo mais do que já o ama agora, porque todos nós fomos criados, por um ato sublime e extraordinariamente particular da Sua Santa Vontade, como herdeiros dos céus e para a glória de Deus: 'Dele, por Ele e para Ele são todas as coisas. A Ele a glória por toda a eternidade!' (Rm 11, 36).

A missão do Bom Pastor é universal, porque o rebanho é universal e só um verdadeiramente é o Bom Pastor, que não abandona nunca as suas ovelhas: 'Haverá um só rebanho e um só pastor' (Jo 10, 16). Todos aqueles que ainda não se encontram no redil do Bom Pastor, a Santa Igreja, devem ser buscados como ovelhas desgarradas, para que se unam ao único rebanho e que, sob a voz do Bom Pastor, sejam conduzidas com segurança às fontes da água da vida (Ap 7, 17): 'Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância' (Jo 1, 10). Jesus nos convoca, assim, à missão de um apostolado universal, delegando a todos nós, os batizados, a enorme tarefa da evangelização para que se faça, no redil da terra, um só rebanho e um só Pastor.

Reconhecer-nos como ovelhas do rebanho do Bom Pastor é manifestar em plenitude a nossa fé e esperança em Jesus Cristo, Deus Único e Verdadeiro: 'Dai graças ao Senhor, porque ele é bom! Eterna é a sua misericórdia!' (Sl 117). Como ovelhas do Bom Pastor, a pedra angular (At 4, 11) que nunca nos será tirada, não nos basta ouvir somente a voz da salvação; é preciso segui-lo em meio às provações da nossa humanidade corrompida, confiantes e perseverantes na fé, pois 'desde já somos filhos de Deus, mas nem sequer se manifestou o que seremos! Sabemos que, quando Jesus se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque o veremos tal como Ele é' (1 Jo 3, 2).

sábado, 20 de abril de 2024

'FICA NA BARCA E CLAMA POR DEUS!'

Por todas as coisas que fez, o Senhor nos ensina como viver aqui na terra. Não há ninguém neste mundo que não seja viajante, ainda que nem todos desejem regressar à pátria. Nós sofremos com as ondas e as tempestades que decorrem da travessia, mas, mesmo assim, fiquemos no navio. Com efeito, se dentro do navio corremos perigo, fora dele a morte é inevitável! Aquele que nada em alto mar pode ter muita força em seus braços, mas será, cedo ou tarde, vencido pela imensidão do oceano, é devorado por ele e desaparece.

Portanto, é necessário estarmos no navio, ou seja, sermos transportados pela madeira de um lenho, para poder atravessar o mar. O madeiro que carrega a nossa fraqueza é a cruz de nosso Senhor, da qual trazemos o sinal em nossa fronte, e que nos impede de ser engolidos pelo mundo. Sofremos as agitações das ondas, mas é o Senhor que nos transporta.

A barca que transporta os discípulos, isto é, a Igreja, navega, e a tempestade das provações a tomam de assalto. O vento contrário, ou seja, o demônio que faz oposição à Igreja, não se acalma, esforçando-se por impedi-la de chegar ao repouso do porto. Grande é, porém, aquele que intercede por nós. Com efeito, durante a tumultuosa navegação em que nos debatemos, ele nos inspira confiança, vem a nós e nos reconforta, a fim de que, sacudidos pela barca, não nos deixemos abater e não nos lancemos ao mar.

Porque, mesmo se a barca é sacudida pelas ondas, é apesar de tudo uma barca, e somente esta barca transporta os discípulos e acolhe Cristo. Ela corre um grande risco no mar mas, fora dela, imediatamente perecemos.

Conserva-te, pois, na barca e clama por Deus. Todos os conselhos podem falhar, o leme pode tornar-se insuficiente, as velas abertas mais perigosas que úteis – quando todos os socorros humanos falharem, só resta aos marinheiros rezar e elevar a Deus seus corações. Aquele que concede aos navegantes a graça de chegar ao porto, iria acaso abandonar a sua Igreja, em vez de reconduzi-la ao repouso?

(Santo Agostinho)

sexta-feira, 19 de abril de 2024

'NO CORAÇÃO DA IGREJA SEREI O AMOR'


Não obstante a minha pequenez, queria iluminar as almas como os Profetas e os Doutores, sentia a vocação de ser Apóstolo... Queria ser missionário, não apenas durante alguns anos, mas queria ter sido desde o princípio do mundo e continuar até a consumação dos séculos. Mas acima de tudo, ó meu amado Salvador, queria derramar o sangue por Vós até a última gota. 

Porque durante a oração estes desejos me faziam sofrer um autêntico martírio, abri as epístolas de São Paulo a fim de encontrar uma resposta. Casualmente fixei-me nos capítulos XII e XIII da Primeira Epístola aos Coríntios e li no primeiro que nem todos podem ser ao mesmo tempo Apóstolos, Profetas e Doutores..., que a Igreja é formada por membros diferentes e que os olhos não podem ao mesmo tempo ser as mãos. A resposta era clara, mas não satisfazia completamente os meus desejos e não me trazia a paz.

Continuei a ler e encontrei esta frase que me confortou profundamente: 'Procurai com ardor os dons mais perfeitos; eu vou mostrar vos um caminho mais excelente'. E o Apóstolo explica como todos os dons mais perfeitos não são nada sem o amor e que a caridade é o caminho mais excelente que nos leva com segurança até Deus. Finalmente tinha encontrado a tranquilidade.

Ao considerar o Corpo Místico da Igreja, não conseguira reconhecer-me em nenhum dos membros descritos por São Paulo; melhor, queria identificar-me com todos eles. A caridade ofereceu-me a chave da minha vocação. Compreendi que, se a Igreja apresenta um corpo formado por membros diferentes, não lhe falta o mais necessário e mais nobre de todos; compreendi que a Igreja tem coração, um coração ardente de amor; compreendi que só o amor fazia atuar os membros da Igreja e que, se o amor viesse a extinguir-se, nem os Apóstolos continuariam a anunciar o Evangelho e nem os mártires a derramar o seu sangue; compreendi que o amor encerra em si todas as vocações, que o amor é tudo e que abrange todos os tempos e lugares; em uma palavra, o amor é eterno.

Então, com a maior alegria da minha alma arrebatada, exclamei: 'Ó Jesus, meu amor! Encontrei finalmente a minha vocação'. A minha vocação é o amor. Sim, encontrei o meu lugar na Igreja, e este lugar, ó meu Deus, fostes Vós que mo destes: no coração da Igreja, minha Mãe, eu serei o amor; com o amor serei tudo; e assim será realizado o meu sonho.

(Santa Teresa de Lisieux)