
04. A MULHER MODERNA
Viviam aquelas pombas irrequietas e felizes na doce paz do seu pombal. Todas as manhãs voavam ao campo, com o pescoço irisado pelo sol e bicavam os grãos que haviam caído ao golpe da foice do ceifeiro. À noite, o pombal dava-lhes abrigo e calor e, ali no ninho escondido na parede, ouviam alegremente o piado dos seus filhotes. Nao careciam de nada; tinham tudo, viviam ditosas e morriam tranquilas.
Mas, eis que um dia apareceu no pombal uma pomba revolucionária. Vinha de outras terras, onde as pombas sacrificavam a felicidade à liberdade, e falou-lhes desta maneira: 'Companheiras, viveis dois séculos atrasadas com respeito às pombas de outros países. Basta de clássicas submissões, de vida aborrecida e estéril. Por que havemos de ser inferiores às patas? Elas podem ir à esterqueira e nós temos medo de nos mancharmos; elas podem banhar-se até na água suja e nós nã temos coragem de meter-nos no rio. Para que defender tanto a nossa alvura, a nossa pureza? Isso sao preconceitos da Idade Média! Cada uma fala o que bem entender, pois para isso é dona de seu corpo e de sua vida. Chega! Vamos à esterqueira! Ao charco!' Todas as pombas incautas aplaudiram a estrangeira agitando as asas. Dirigidas pela revolucionária, voaram para um pântano infecto que se via à distância. Enlambuzaram-se, revolveram-se no lodo com grande algazarra e... não vos direi como saíram dali as pombas!
Assim, caros leitores, viviam em nossa terra ditosas e tranquilas mulheres. No ninho do seu lar viviam em paz a vida do trabalho e do amor. Mas a civilização revolucionária começou a cantar o seu canto de sereia assim: 'Como! Ficareis toda a vida fechadas em casa? E escravas dos homens? Basta, basta já de submissões! Nao vedes como se chegou, em outros países, à emancipação da mulher? Abandonai os vossos preconceitos medievais! A mulher é dona do seu corpo e de sua vida. Por que sacrificar à alvura da pureza todas as alegrías do prazer? Ao charco! Ao pântano! E as mulheres modernas lançaram-se e revolveram-se no charco da vida... e não vos direi eu como saem dele as mulheres de hoje!
05. O REMORSO DE CONSCIÊNCIA
Em 1859, uma aldeia da Morávia, chamada Leibnitz, foi devastada por um pavoroso incêndio. A princípio, ninguém suspeitou que o fogo tivesse sido obra de urna terrível vinganga. O que chamou a atenção foi que, desde o dia do incêndio, um dos habitantes se afastava cautelosamente dos demais e passava seus dias em casa, sempre sozinho, com as portas cerradas. Era o incendiário que, depois do seu crime, via continuamente os espectros das vítimas que pereceram no fogo.
Estas bailavam diante dos seus olhos e, apontando para uma árvore do quintal, pareciam dizer-lhe: 'Ali serás enforcado!' O infeliz então cortou a árvore. Em vão. Os moradores do povoado viam-no rezar todos os dias ajoelhado e erguendo as mãos aos céus. Nem assim teve sossego. Por fim, ele mesmo foi apresentar-se às autoridades, dizendo: 'Eu sou o culpado, eu sou o autor do incêndio!'
Ah! É inútil. Pretendem alguns abafar a voz da consciência, entregando-se aos prazeres e folguedos; mas é inútil. Por algum tempo, talvez, a consciência ficará calada; mas chega um dia em que, dentro de nós, ela começa a gritar com a severidade de um juiz: 'Tu és o incendiário! Tu és o assassino! Tu és o pecador!'
06. SE NÃO HOUVESSE INFERNO...
Nos terríveis dias da Revolução Francesa, um pároco de Lyon foi barbaramente arrastado aos tribunais.
➖ Crês que há um inferno? - perguntou-lhe cinicamente um dos juízes revolucionários.
➖ Claro que sim - respondeu o pároco; e se não cresse, vendo agora os vossos crimes, não teria dúvida em crer; porque, se de fato não existisse o inferno, seria mister inventá-lo para vos castigar!
(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos' - Volume II, do Pe. Francisco Alves, 1960; com adaptações)