Capítulo C
Meios de se Evitar o Purgatório - Privilégios do Santo Escapulário: Preservação dos Tormentos do Inferno e Libertação do Primeiro Sábado - Exemplos do Cumprimento destas Promessas
De acordo com o que dissemos, a Santíssima Virgem anexou dois grandes privilégios ao Santo Escapulário; por sua vez, os Soberanos Pontífices acrescentaram a eles as mais ricas indulgências. Não falaremos aqui sobre as duas indulgências, mas consideramos útil dar a conhecer esses dois preciosos privilégios, um sob o nome de Preservação, o outro sob o nome de Libertação.
O primeiro é a isenção dos tormentos do inferno: In hoc moriens aeternum non patietur incendium - Aquele que morrer usando este hábito não sofrerá o fogo do inferno. É evidente que aquele que morrer em pecado mortal, mesmo usando o escapulário, não estará isento da condenação; e não é esse o significado da promessa de Maria. Essa boa Mãe prometeu misericordiosamente dispor todas as coisas de tal modo que aquele que morrer usando esse santo hábito receberá uma graça eficaz digna de confessar e lamentar as suas faltas; ou, se for surpreendido por uma morte súbita, terá tempo e vontade para fazer um ato de perfeita contrição. Poderíamos encher um volume com os eventos milagrosos que comprovam o cumprimento dessa promessa. Basta relatar alguns deles.
O Venerável [Santo] Padre de la Colombiere nos conta que uma jovem, que era muito piedosa e usava o santo escapulário, teve a infelicidade de se desviar do caminho da virtude. Em consequência da má literatura e de companhias perigosas, ela caiu nas maiores desordens e estava prestes a perder a sua honra. Em vez de se voltar para Deus e recorrer à Santíssima Virgem, que é o refúgio dos pecadores, ela se abandonou ao desespero. O demônio logo sugeriu um remédio para os seus males - o terrível remédio do suicídio, que poria fim às suas misérias temporais para mergulhá-la em tormentos eternos. Ela correu para um rio e, ainda usando o escapulário, jogou-se na água. Mas - ó maravilha de Deus! - ela flutuou em vez de afundar e, assim, não conseguiu encontrar a morte que procurava. Um pescador, que a viu, apressou-se em ajudá-la, mas a infeliz criatura o impediu: arrancando o escapulário, ela o jogou longe de si e afundou imediatamente. O pescador não conseguiu salvá-la, mas encontrou o escapulário e reconheceu que essa vestimenta sagrada, enquanto havia sido usada, havia impedido a pecadora de cometer suicídio.
No hospital de Toulon, havia um oficial, um homem muito ímpio, que se recusava a ver um padre. A morte se aproximava e ele caiu em uma espécie de letargia. Os assistentes aproveitaram esse fato para colocar um escapulário em seu pescoço, sem que ele soubesse. Ao se recuperar logo depois, ele gritou com fúria: 'Por que vocês colocaram fogo em mim, um fogo que me queima? Tirem-no daqui, tirem-no daqui!' Então, invocaram a Santíssima Virgem e tentaram novamente colocar nele o escapulário. Ele percebeu isso, arrancou-o com raiva, jogou-o longe de si e, com uma horrível blasfêmia nos lábios, expirou.
O segundo privilégio, o Sabatino ou da Libertação, consiste em ser liberado do Purgatório pela Santíssima Virgem no primeiro sábado após a morte. Para desfrutar desse privilégio, certas condições devem ser cumpridas. Primeiro, observar a castidade de nosso estado. Segundo, recitar o Pequeno Ofício da Santíssima Virgem. Aqueles que recitam o Ofício Canônico satisfazem essa condição. Aqueles que não sabem ler devem, em vez de rezar o Ofício, observar os jejuns prescritos pela Igreja e abster-se de carne em todas as quartas-feiras, sextas-feiras e sábados. Terceiro, em caso de necessidade, a obrigação de recitar o Ofício, a abstinência e o jejum podem ser comutados em outras obras piedosas, por aqueles que têm o poder de conceder tais dispensas. Esse é o privilégio Sabatino ou da Libertação, com as condições necessárias para desfrutá-lo. Se nos lembrarmos do que foi dito sobre os rigores do Purgatório e sua duração, veremos que esse privilégio é muito precioso e suas condições muito fáceis des erem aplicadas. Sabemos que foram levantadas dúvidas quanto à autenticidade da Bula Sabatina, mas, além da tradição constante e da prática piedosa dos fiéis, o grande Papa Bento XIV, cuja eminente erudição e moderação de opiniões são bem conhecidas, pronunciou-se a seu favor.
Em Otranto, uma cidade do reino de Nápoles, uma senhora de alta posição teve grande prazer em assistir aos sermões de um padre carmelita que era um grande promotor da devoção a Maria. Ele assegurava a seus ouvintes que todos os cristãos que usassem piedosamente o escapulário e cumprissem as condições pré-estabelecidas veriam a Mãe Divina em sua partida deste mundo, e que essa grande consoladora dos aflitos viria no sábado após a morte para libertá-los do Purgatório e levá-los para a morada dos bem aventurados. Impressionada com essas preciosas vantagens, essa senhora imediatamente vestiu a túnica da Santíssima Virgem, firmemente decidida a observar fielmente as regras da Confraria. Sua piedade progrediu rapidamente. Ela rezava a Maria dia e noite, depositava nela toda a sua confiança e lhe prestava todas as homenagens possíveis. Entre outros favores que pediu, implorou que morresse em um sábado, para que pudesse ser libertada mais cedo do Purgatório.
Suas preces foram ouvidas. Alguns anos depois, tendo adoecido, apesar da opinião contrária de seu médico, ela declarou que sua doença a levaria ao túmulo. 'Eu bendigo a Deus' - acrescentou - 'na esperança de estar logo unida a Ele no Céu'. Sua doença progrediu tão rapidamente que os médicos declararam unanimemente que ela estava à beira da morte e que não conseguiria viver até o fim do dia, que era quarta-feira. 'Vocês estão novamente enganados' - disse a senhora doente - 'viverei mais três dias e não morrerei até sábado'. O evento justificou suas palavras. Considerando os dias de sofrimento que lhe restavam como um tesouro inestimável, ela os aproveitou para purificar sua alma e aumentar seus méritos. Quando chegou o sábado, ela entregou a sua alma nas mãos do Criador.
Sua filha, que também era muito piedosa, estava inconsolável em seu luto. Enquanto orava em seu oratório pela alma de sua querida mãe e derramava lágrimas abundantes, um grande servo de Deus, que era habitualmente favorecido com comunicações sobrenaturais, foi até ela e disse: 'Pare de chorar, minha filha, ou melhor, deixe que sua dor se transforme em alegria. Venho assegurar-lhe, da parte de Deus, que hoje, sábado, graças aos privilégios concedidos aos membros da Confraria do Escapulário, sua mãe foi para o céu e está entre os eleitos. Fiquem consolados e abençoem a Virgem Augustíssima, a Mãe da Misericórdia'.
Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog.