(O Desbravador, julho/agosto de 2002)
SENDARIUM
Um Caminho de Vida Espiritual para o Apostolado Leigo.
segunda-feira, 28 de outubro de 2024
CARTA DE SÃO JUDAS TADEU
Caríssimos, estando eu muito preocupado em vos escrever a respeito da nossa comum salvação, senti a necessidade de dirigir-vos esta carta para exortar-vos a pelejar pela fé, confiada de uma vez para sempre aos santos.
.... Mas vós, caríssimos, lembrai-vos das palavras que vos foram preditas pelos apóstolos de nosso Senhor Jesus Cristo, os quais vos diziam: 'No fim dos tempos virão impostores, que viverão segundo as suas ímpias paixões; homens que semeiam a discórdia, homens sensuais que não têm o Espírito'.
Mas vós, caríssimos, edificai-vos mutuamente sobre o fundamento da vossa santíssima fé. Orai no Espírito Santo. Conservai-vos no amor de Deus, aguardando a misericórdia de nosso Senhor Jesus Cristo, para a vida eterna.
Para com uns exercei a vossa misericórdia, repreendendo-os, e salvai-os, arrebatando-os do fogo. Dos demais tende compaixão, repassada de temor, detestando até a túnica manchada pela carne.
Àquele, que é poderoso para nos preservar de toda queda e nos apresentar diante de sua glória, imaculados e cheios de alegria, ao Deus único, Salvador nosso, por Jesus Cristo, Senhor nosso, sejam dadas glória, magnificência, império e poder desde antes de todos os tempos, agora e para sempre. Amém.
(Jd 1,3.17-25)
domingo, 27 de outubro de 2024
EVANGELHO DO DOMINGO
'Maravilhas fez conosco o Senhor, exultemos de alegria!' (Sl 125)
Primeira Leitura (Jr 31,7-9) - Segunda Leitura (Hb 5,1-6) - Evangelho (Mc 10,46-52)
27/10/2024 - TRIGÉSIMO DOMINGO DO TEMPO COMUM
47. 'SENHOR, QUE EU VEJA!'
São Marcos descreve, no Evangelho deste domingo, uma certa caminhada de Jesus pelas terras da Galileia, rumo a Jerusalém. Junto com Ele, além dos seus discípulos, ia uma grande multidão, ansiosa por ver, ouvir e compartilhar as santas alegrias do convívio com Aquele por quem já estavam plenamente convencidos de ser realmente o Messias esperado pelos séculos, ainda que com uma visão algo distorcida da verdadeira natureza divina do seu reino de glória.
O burburinho da multidão em marcha coloca em alerta um mendigo cego sentado à beira do caminho. Um homem cego, muito conhecido naquela região, tão conhecido que o seu nome ficou transcrito para sempre nas páginas das Sagradas Escrituras, Bartimeu, filho de Timeu. No meio do vozerio de tantos, grita mais alto do que todos: 'Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!' (Mc 10, 47). E, diante da reprimenda para se calar e não abafar os ensinamentos de Jesus, insiste ainda mais alto: 'Jesus, filho de Davi, tem piedade de mim!' (Mc 10, 48).
A fé vibrava firme na sua alma sem precisar dos acordes dos olhares e visões do mundo. Jesus percebeu de imediato a grandeza daquele sentimento, daquele gesto, daquela súplica, e o atendeu com deferência, fazendo calar o vozerio em volta: 'Chamai-o' (Mc 10, 49). De pronto e de súbito, diante do chamado de Jesus, Bartimeu se apura em pé num salto, desfaz-se do manto de uma vez e se coloca diante do Senhor, em muda expectativa. 'O que queres que eu te faça?' (Mc 10, 51) pergunta Jesus. E Bartimeu responde, cheio de fé e confiança no Senhor: 'Mestre, que eu veja!' (Mc 10, 51). E a luz da sua fé é então contemplada com os acordes da visão do Senhor: 'Vai, a tua fé te curou' (Mc 10, 52).
Bartimeu, privilegiado na graça, pediu a visão e recebeu a luz, a luz de Cristo, que rompe as trevas do pecado e eleva a alma às glórias eternas. Como cegos, muitas vezes tateando nas penumbras de uma fé claudicante, temos uma imensa dificuldade de vida espiritual e de aceitar e acolher Jesus em plenitude. Como Bartimeu, sejamos capazes de saltar além das quietudes e sonolências terrenas e nos livrarmos do manto das inquietações e vozerios do mundo, para irmos ao encontro do Senhor que passa e, como homens eivados de graça, 'seguir Jesus pelo caminho' (Mc 10, 52).
sábado, 26 de outubro de 2024
A BÍBLIA EXPLICADA (XXIX) - AS PRAGAS DO EGITO
A Escritura, sem dúvida, apresenta repetidamente as 'Pragas do Egito' como fenômenos milagrosos*. O autor inspirado julga-as como tal e esse deve ser o juízo do exegeta. Por outro lado, quase todos os fatos descritos têm clara analogia com fenômenos naturais que de vez em quando ocorriam no Egito (rās, mosquitos, pústulas, granizos, gafanhotos). Pode deduzir-se daí que o caráter milagroso das 'pragas' algumas vezes não reside na substância, porém no modo. As 'pragas', com efeito, ocorrem como consequência da ordem de Moisés, de maneira mais trágica que o usual, não muito tempo após a outra, poupando de seus efeitos mortíferos os israelitas.
* Milagre é um fato experimental, que não decorre do jogo usual das forças da natureza, porém, de uma intervenção direta do poder de Deus. Esta intervenção direta de Deus pode manifestar-se de três modos: ou o efeito é totalmente estranho às forças naturais e às leis da natureza e, neste caso, os teólogos falam de milagre quoad substantiam, a saber naquilo que se refere à substância, à própria natureza íntima do fato (p. ex: a glorificação dos corpos ressuscitados); ou o efeito é movido por forças naturais, porém não se aplica a todos os seres (milagres quoad subiectum: p. ex.: a natureza é capaz de fornecer a capacidade visual, porém não a um cego que tenha o órgão da vista irreparàvelmente comprometido, bem como a vida, mas não para um morto); ou trata-se de um efeito possível para a natureza, porém não de um modo corrente ou usual (um tempo prolongado de carência, uma tempestade ou um terremoto ou outro fenômeno natural que ocorra exatamente quando intimado por um profeta); trata-se então de um milagre quoad modum.
O gênero literário desta narrativa apresenta a particularidade estilística das fórmulas fixas, como no primeiro capítulo do Gênesis e a de partes simétricas bipartidas entre comando e execução como na narrativa do Dilúvio. Um exemplo foi citado quando se tratava dos cânones artísticos. Aqui também se trata então de uma narrativa artisticamente esquematizada. Isto não invalida a historicidade dos acontecimentos e da própria narrativa, mas sugere a hipótese de que se possam encontrar disseminados aí modos de dizer 'hiperbólicos' ou 'correlatos', tais como encontramos nas descrições das mesmas 'pragas', no capítulo 17 do Livro da Sabedoria, que se apresentam claramente como ampliações poéticas com finalidade didática; didático e poético realmente é o gênero literário do livro em que se encontram.
Tem-se, ao contrário, uma narrativa esquemática dos mesmos fatos nos Salmos 77 [78] e 104 [105]. Muitos intérpretes colocam entre os milagres quoad substantiam, ou seja quoad subiectum, a água transformada em sangue (ou melhor em aparência de sangue, não sendo necessário incorporar nela glóbulos vermelhos e os outros elementos do sangue vivo), as trevas e a morte dos primogênitos. Pode-se, entretanto, considerar provável a identificação parcial das duas primeiras calamidades com dois fenômenos bem conhecidos no Egito; a saber: a cor vermelho-escura que o Nilo adquire pela presença de inúmeros infusórios no início de julho e a obscuridade que frequentemente ocorre no Egito, nos fins de março, causada pela areia levantada pelo vento do deserto.
Notemos, além disso, como a ordem em que as pragas se sucedem exibe uma coincidência notável com a ordem e a época de aparições de fenômenos naturais correspondentes: primeira: o avermelhamento do Nilo (em julho, a época da inundação); segunda, terceira e quarta: rās e mosquitos, cuja multiplicação coincide com a cheia do Nilo (no verão e outono); quinta e sexta: peste e pústulas, enfermidades do período invernal; sétima: granizos: fenômeno bastante raro, que se verifica quase que exclusivaente em janeiro e fevereiro; oitava: os gafanhotos, bastante raros também (início da primavera); nona: as nuvens de areia (final de março, exatamente à época da Páscoa, em que se dá a partida dos hebreus do Egito); décima: as trevas e a morte dos primogênitos (sem correlação com eventos naturais).
Porém, não obstante estas analogias, fica sempre claro que todas as dez 'pragas' outra coisa não são que milagres, como já dissemos, porque têm início e término por ordem de Moisés com proporções e efeitos preternaturais. As citadas coincidências com os flagelos tipicamente maturais destinam-se apenas para eliminar no leitor a impressão eventual de extravagância dos prodígios e a tornar ainda mais plausível o caráter histórico dos mesmos.
Quanto aos mágicos egípcios, que no primeiro milagre (Ex 7,9-12) e nas duas primeiras pragas parecem imitar os prodígios de Moisés, tem-se o direito de supor que se trate de alguma ilusão ou de algum hábil artifício, à maneira das técnicas ilusionistas dos atuais faquires. Sua intervenção é assinalada para por em evidência a origem divina dos prodígios de Moisés. Há realmente um clímax e uma sequência crescente: a princípio os mágicos se dão bem, depois não mais são bem sucedidos, depois são obrigados a confessar a presença do 'dedo de Deus' (Ex 8, 15) e, por fim, eles próprios tornam-se vítimas do flagelo das pústulas (Ex 9, 11).
(Excertos adaptados da obra 'Páginas Difíceis da Bíblia - Antigo Testamento', de E. Galbiati e A. Piazza)
sexta-feira, 25 de outubro de 2024
BÊNÇÃOS DO ROSÁRIO (III)
Quando São Domingos estava a pregar o Rosário perto de Carcassone, foi-lhe trazido um albigense que estava possuído pelo demônio. O santo exorcizou-o na presença de uma grande multidão de pessoas; cerca de doze mil pessoas que tinham vindo ouvi-lo falar. Os demônios que estavam na posse deste infeliz homem, foram obrigados a responder às perguntas de São Domingos. Disseram então que havia quinze mil deles no corpo daquele pobre homem, porque porque ele tinha atacado os quinze mistérios do Rosário e que a pregação do santo sobre o Rosário impunha medo e horror nas profundezas do inferno e que, por isso, ele era o homem que mais odiavam em todo o mundo por causa das almas que por causa das almas que lhes eram arrebatadas pela devoção ao Rosário.
São Domingos colocou o seu terço ao pescoço do endemoninhado e perguntou-lhe quem era, de todos os santos do Céu, aquele que, dos santos do Céu, aquele que mais temiam e que, por isso, devia ser o mais amado e venerado pelos homens. Diante disso, começaram a gritar enlouquecidos, a tal ponto que a maior parte das pessoas presentes caiu por terra, tomada de medo.
Então, usando de toda a astúcia para não responderem diretamente a pergunta, os demônios choravam e lamentavam-se de uma forma tão deprimente que muitos choraram também, por pura piedade natural. Os demônios, falando pela boca do albigense, suplicavam com uma voz de dor: 'Domingos, Domingos, tem piedade de nós, prometemos-te que nunca te faremos mal. Sempre tiveste compaixão dos pecadores e dos aflitos; tem piedade de nós, porque estamos em graves sofrimentos. Se já estamos sofrendo tanto, por que te comprazes em aumentar as nossas dores? Não podeis contentar-vos com as dores que já temos? Tende piedade de nós, tende piedade de nós!' São Domingos não se comoveu nem um pouco com as palavras patéticas daqueles espíritos miseráveis e disse-lhes que não os deixaria em paz, até que respondessem à sua pergunta.
... ''Escutai então, cristãos. Esta Mãe de Jesus é poderosíssima para salvar os seus servos de caírem no inferno. Ela é como o sol que destrói as trevas das nossas artimanhas e tentações. É Ela que desvenda as nossas tramas ocultas, quebra as nossas armadilhas e torna inúteis e ineficazes as nossas tentações. Devemos dizer, no entanto, com relutância, que nenhuma alma que tenha realmente perseverado no seu serviço se perdeu conosco. Um só suspiro que ela oferece à Santíssima Trindade vale muito mais do que todas as orações, desejos e aspirações de todos os santos. Tememo-la mais do que todos os outros santos do Céu juntos, e não temos sucesso algum com os seus fiéis servidores'.
(Excertos da obra 'O Segredo do Rosário', de São Luís Maria Grignion de Montfort)
quinta-feira, 24 de outubro de 2024
TRATADO SOBRE A HUMILDADE (XII)
58. Não devemos ser demasiado afoitos em nos lisonjear por possuir alguma virtude especial. A nossa castidade pode ser o resultado da falta de oportunidades ou de tentações; do mesmo modo, a nossa paciência pode proceder de um temperamento tranquilo ou mesmo ser ditada pela sabedoria mundana e não pela virtude cristã. Devemos estudar bem esta doutrina, de que as verdadeiras virtudes cristãs 'não nascem do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus' [Jo 1,13], isto é, que elas não são obra nem dos desejos, nem das paixões, nem da razão do homem, mas procedem de Deus como seu primeiro princípio, e retornam a Deus como seu último fim.
Este conhecimento é necessário para nós, para que não nos imaginemos virtuosos quando não o somos, nem nos julguemos melhores do que os outros quando os vemos cair em algum pecado. Devemos sempre aprender lições de humildade com as faltas dos outros, e dizer: 'se eu me encontrasse nas mesmas circunstâncias e tivesse tido a mesma tentação, talvez me tivesse saído pior'. Se Deus não permite que grandes tentações me assaltem, é porque conhece a minha fraqueza e que eu sucumbiria a elas; com olhos de compaixão, Ele vê o que eu sou, 'um homem fraco' [Sb 9,5]. E se não caio em pecado, não é por minha própria virtude, mas pela graça de Deus. Permaneço, pois, na humildade, e isso é vantajoso para mim porque, se na minha soberba me considero maior do que os outros, Deus me abandona e me deixa cair, e me humilha naquilo que eu desejaria me exaltar. Escutai o conselho de Santo Agostinho: 'Atrevo-me a dizer que é proveitoso que os soberbos caiam, para que sejam humilhados por aquilo pelo que se exaltaram' [Serm. liii, de Verb. Dom.].
('A Humildade de Coração', de Fr. Cajetan (Gaetano) Maria de Bergamo, 1791, tradução do autor do blog)
quarta-feira, 23 de outubro de 2024
BÊNÇÃOS DO ROSÁRIO (II)
Branca de Castela, rainha da França, encontrava-se em profunda tristeza porque, doze anos após o seu casamento, ela ainda não tinha filhos. Quando São Domingos foi vê-la, ele a aconselhou a rezar o Rosário todos os dias para pedir a Deus a graça da maternidade, e ela fielmente seguiu seu conselho. Em 1213, ela deu à luz seu filho mais velho, Filipe, mas a criança morreu na infância.
O fervor da rainha não foi de forma alguma entorpecido por essa grande decepção; pelo contrário, ela buscou a ajuda de Nossa Senhora mais do que nunca. Ela fez com que um grande número de Rosários fossem distribuídos a todos os membros da corte e também a pessoas em várias cidades do reino, pedindo que se juntassem a ela para implorar a Deus por uma bênção dos Céus. Assim, em 1214, nasceu São Luís — o príncipe que se tornaria a glória da França e o modelo de todos os reis cristãos.
(Excertos da obra 'O Segredo do Rosário', de São Luís Maria Grignion de Montfort)
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