Capítulo XCIII
Vantagens e Recompensas pela Devoção às Santas Almas - Santa Catarina de Sena e a Salvação da Alma de Palmerine - Santa Madalena de Pazzi e sua Mãe
Deus está mais inclinado a recompensar do que a punir e, se inflige um castigo àqueles que esquecem as almas tão caras ao seu Coração, mostra-se verdadeiramente grato àqueles que o auxiliam junto ás lama sofredoras. Em recompensa, dir-lhes-á um dia: 'Vinde, benditos de meu Pai, possuí o reino que vos está preparado. Tivestes misericórdia dos vossos irmãos necessitados e sofredores; em verdade vos digo que, sempre que o fizestes a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes' (Mt 25,40). Muitas vezes, nesta vida, Jesus recompensa as almas compassivas e caridosas com a concessão de muitos favores.
Santa Catarina de Sena, pela sua caridade, converteu uma pecadora chamada Palmerine, que morreu e foi para o Purgatório. A santa não descansou enquanto não libertou esta alma. Em recompensa, Nosso Senhor permitiu mostroar-se à sua serva, como uma conquista gloriosa da sua caridade. O Beato Raymond conta assim os pormenores: 'Em meados do século XIV, quando Santa Catarina edificava a sua cidade natal com toda a espécie de obras de misericórdia, uma mulher de nome Palmerine, depois de ter sido objeto da sua mais terna caridade, concebeu uma secreta aversão pelos seus benfeitores, que chegou a degenerar em ódio implacável. Não podendo mais ver nem ouvir a santa, a ingrata Palmerine, amargurada contra a serva de Deus, não cessava de manchar a sua reputação com as mais atrozes calúnias. Catarina fez tudo o que estava ao seu alcance para a conciliar, mas em vão. Então, vendo que a sua bondade, a sua humildade e os seus benefícios não serviam senão para excitar a fúria desta infeliz mulher, implorou fervorosamente a Deus que se dignasse mover aquele coração tão obstinado.
Deus ouviu a sua oração, atingindo Palmerine com uma doença mortal; mas, ainda assim, este castigo não foi suficiente para a fazer entrar em si. Em troca de toda a ternura que a santa lhe dedicava, a infeliz mulher carregou-a de insultos e expulsou-a da sua presença. Entretanto, o seu fim aproximava-se e um sacerdote foi chamado para administrar os últimos sacramentos. A doente não estava em condições de os receber, devido ao ódio que alimentava e ao qual se recusava a renunciar. Ao ouvir isto, e vendo que a infeliz criatura já tinha um pé no Inferno, Catarina derramou uma torrente de lágrimas e ficou inconsolável. Durante três dias e três noites, não cessou de suplicar a Deus em seu favor, juntando o jejum à oração. 'Senhor' - dizia ela - 'permitirás que esta alma se perca por minha causa? Conjuro-Vos que me concedais, a qualquer preço, a sua conversão e a sua salvação. Castigai-me pelo seu pecado, de que eu sou a causa: não é a ela, mas a mim, que o castigo deve atingir. Senhor, não me recuseis a graça que Vos peço: não vos deixarei enquanto não a tiver obtido. Em nome da vossa bondade, da vossa misericórdia, suplico-vos, misericordiosíssimo Salvador, que não permitais que a alma desta minha irmã deixe o seu corpo enquanto não for restituída à vossa graça'.
A sua oração, acrescenta o seu biógrafo, foi tão poderosa que impediu a morte da doente. A sua agonia durou três dias e três noites, para grande espanto das enfermeiras. Durante este tempo, Catarina continuou a interceder e acabou por obter a vitória. Deus não resistiu e fez um milagre de misericórdia. Um raio de luz celeste penetrou no coração da moribunda, mostrou-lhe a sua culpa e incitou-a ao arrependimento. A santa, a quem Deus revelou isto, apressou-se a ir ter com a doente. Logo que a mulher a viu, deu-lhe todos os sinais de consideração e agradecimento, acusou-se em voz alta da sua falta, recebeu com piedade os últimos sacramentos e morreu na graça de Deus.
Apesar da sinceridade da sua conversão, era de recear que uma pecadora que escapara por pouco ao Inferno tivesse de passar por um Purgatório severo. A caridosa Catarina continuou a fazer tudo o que estava ao seu alcance para apressar o momento em que Palmerine seria admitido à glória do Paraíso. Tanta caridade não podia deixar de ter a sua recompensa. Nosso Senhor - escreve o Beato Raymond - mostrou à sua esposa aquela alma salva pelas suas orações. Era tão brilhante que ela me disse não encontrar palavras capazes de exprimir a sua beleza. Não estava ainda admitida à glória da visão beatífica, mas tinha aquele brilho que a criação e a graça do batismo lhe conferem. Nosso Senhor disse-lhe então: 'Olha, minha filha, esta alma perdida que encontraste!' E acrescentou: 'Não te parece muito bela e preciosa? Quem não suportaria todo o tipo de sofrimento para salvar uma criatura tão perfeita e introduzi-la na vida eterna? Se Eu, que sou a Beleza Suprema, de quem emana toda a beleza, me deixei cativar pela beleza das almas, a ponto de descer à terra e derramar o meu Sangue para as redimir, com quanto maior razão não deveríeis trabalhar uns pelos outros, para que não se percam criaturas tão admiráveis. Se vos mostrei esta alma, foi para que sejais ainda mais zelosos em tudo o que diz respeito à salvação das almas'.
Santa Madalena de Pazzi, tão cheia de devoção pelos mortos, esgotou todos os recursos da caridade cristã em favor de sua mãe, depois que esta partiu desta vida. Quinze dias depois da sua morte, Jesus, querendo consolar a sua esposa, mostrou-lhe a alma da sua querida mãe. Madalena viu-a no Paraíso, vestida com um esplendor deslumbrante e rodeada de santos, que pareciam ter grande interesse por ela. Ouviu a alma bendita dar-lhe três ordens, que ficaram para sempre impressas na sua memória: 'Cuida, minha filha' - disse ela - 'de descer o mais baixo possível na humildade, de observar a obediência religiosa e de cumprir com prudência tudo o que ela prescreve'. Dizendo isso, Madalena viu sua abençoada mãe desaparecer de vista e permaneceu inundada com a mais doce consolação.
Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog.