segunda-feira, 21 de outubro de 2024

BÊNÇÃOS DO ROSÁRIO (I)


Gluck, o célebre compositor, era filho de pais muito pobres em Viena. Tinha uma bela voz, mas, quando cantava no coro da catedral, tinha o cuidado de fazê-lo como uma oração, de modo a não chamar a atenção do público sobre si.

Um dia, depois de ter cantado um hino a Maria, em melhor estilo do que o habitual, um monge aproximou-se dele e disse-lhe com emoção: 'Meu filho, fizeste-me derramar hoje as lágrimas mais prazeirosas da minha vida. Não tenho nada para te dar em sinal da minha admiração, a não ser este rosário. Guarda-o em minha memória. Reza pelo menos uma parte dele todos os dias; e se fores fiel a esta prática, serás tão querido por Deus como serás um dia grande entre os homens'.

Gluck permaneceu fiel ao seu Rosário. A sua família era demasiado pobre para lhe permitir prosseguir os estudos. Uma noite, recebeu a visita de um célebre mestre estrangeiro de coro que, percebendo o seu talento, encarregou-se de levar o rapaz consigo, prometendo-lhe completar a sua instrução. A partir daí, Gluck percorreu com passos de gigante o caminho da fama, mas sempre fiel às suas práticas de piedade.

Na Corte de Viena, palco de grandes festas noturnas, o ilustre maestro desaparecia e, como um padre cumprindo o seu ofício estrito, procurava a solidão para rezar o terço. Quando a morte, depois de uma vida gloriosa, veio abatê-lo, encontrou-o preparado. Tinha na mão as contas que o piedoso monge lhe tinha oferecido nos seus dias de juventude.

domingo, 20 de outubro de 2024

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'Sobre nós venha, Senhor, a vossa graça, pois, em vós, 
nós esperamos!' (Sl 32)

Primeira Leitura (Is 53,10-11) - Segunda Leitura (Hb 4,14-16) -  Evangelho (Mc 10,35-45)

  20/10/2024 - VIGÉSIMO NONO DOMINGO DO TEMPO COMUM

46. QUEM ESTARÁ À DIREITA OU À ESQUERDA DO SENHOR?


A glória humana alimentava o pedido despropositado de Tiago e João, filhos de Zebedeu, feito a Jesus quando da sua derradeira subida a Jerusalém: 'Deixa-nos sentar um à tua direita e outro à tua esquerda, quando estiveres na tua glória!' (Mc 10, 37). Aqueles dois homens (que representam o conjunto de todos os demais apóstolos, que se 'indignaram' depois pela audácia deles), mais do que moldados pela graça, ainda estavam envoltos pela penumbra das glórias terrenas e, na dimensão dos poderes de um reino fictício no mundo dos homens, pleiteavam os postos mais elevados 'à direita e à esquerda' do Senhor.

Jesus vai prometer a ambos uma glória muito maior que qualquer poder concedido na escala dos homens. Os poderes e as glórias do mundo, por maiores que sejam, são instáveis e passageiros; Jesus tem a oferecer a eles heranças eternas. Na busca dos valores humanos, imperam a cobiça, a ambição, a disputa desenfreada por aplausos e pompas; a eternidade é moldada pelo recolhimento interior, pela oração e despojamento do ser, pela via do sofrimento e da dor: 'Por acaso podeis beber o cálice que eu vou beber?' (Mc 10, 38).

Quando ambos afirmam que 'sim', estão sendo apenas suscetíveis à crença de superação de dificuldades passageiras. Não conseguem vislumbrar os eventos tão próximos da Paixão e Morte do Senhor, o drama do Calvário, tantas vezes mencionado e reafirmado por Jesus em outras ocasiões. Jesus vai, num primeiro momento, confirmar este 'sim': 'Vós bebereis o cálice que eu devo beber, e sereis batizados com o batismo com que eu devo ser batizado' (Mc 10, 39). Com efeito, São João, o discípulo amado, acompanhou Jesus até o instante derradeiro da Paixão e Morte na Cruz; São Tiago foi o primeiro apóstolo a colher as palmas do martírio.

Mas, em seguida, Jesus os alerta que as moradas eternas estão destinadas àqueles forjados pela Santa Vontade do Pai: 'não depende de mim conceder o lugar à minha direita ou à minha esquerda. É para aqueles a quem foi reservado' (Mc 10, 40). Na escala dos valores eternos, o maior é o que serve a todos, o posto mais alto será destinado ao que, por amor a Deus, tornar-se o menor entre os seus irmãos. A verdadeira glória passa pelo Calvário, por uma senda de dor e de sofrimento, e quem estará 'à direita ou à esquerda' de Jesus será aquele que viver e morrer, com maior semelhança, a própria vida e morte do Senhor: 'Porque o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida como resgate para muitos' (Mc 10, 45).

sábado, 19 de outubro de 2024

O DOGMA DO PURGATÓRIO (XC)

 

Capítulo XC

Vantagens e Recompensas pela Devoção às Santas Almas - O Caso do Arcebispo Sandoval em Louvain - O Advogado que Renunciou ao Mundo - A Aparição do Irmão Latti ao Dr. Verdiano

Citemos aqui outro exemplo, tanto mais digno de menção quanto um grande papa, Clemente VIII, viu nele o próprio dedo de Deus e recomendou sua publicação para a edificação da Igreja. 'Vários autores' - diz o Padre Rossignoli - 'relataram a maravilhosa assistência que Cristóvão Sandoval, Arcebispo de Sevilha, recebeu das almas do Purgatório'. Ainda criança, ele tinha o costume de distribuir parte do seu dinheiro de bolso em esmolas para o benefício das santas almas. A sua piedade aumentava com a idade; por amor das pobres almas sofredoras, dava tudo o que podia dispor, chegando mesmo a privar-se de várias pequenas coisas úteis ou necessárias. Quando prosseguia os seus estudos na Universidade de Louvain, aconteceu que algumas cartas que esperava de Espanha se atrasaram, pelo que se viu reduzido a tais dificuldades pecuniárias que mal tinha dinheiro para comprar comida. Nesse momento, um pobre pediu-lhe uma esmola por amor das almas do Purgatório e, o que nunca lhe tinha acontecido, viu-se obrigado a recusar.

Afligido por esta circunstância, entrou em uma igreja. 'Se' - disse ele - 'não posso dar uma esmola pelas minhas pobres almas, posso pelo menos dar-lhes a ajuda pelas minhas orações'. Mal tinha acabado a sua oração quando, ao sair da igreja, foi abordado por um belo jovem, vestido como um viajante, que o saudou com respeitosa afabilidade. Cristóvão experimentou um sentimento de temor religioso, como se estivesse na presença de um espírito em forma humana. Mas foi logo tranquilizado pelo seu amável interlocutor, que lhe falou com a maior convicção do Marquês de Denia, seu pai, dos seus parentes e amigos, tal como o faria um espanhol recém-chegado da Península. Terminou pedindo-lhe que o acompanhasse a um hotel, onde poderiam jantar juntos e estar mais à vontade. Sandoval, que não comia nada desde o dia anterior, aceitou de bom grado a oferta. Sentaram-se então à mesa e continuaram a conversar agradavelmente. Depois da refeição, o forasteiro deu a Sandoval uma quantia em dinheiro, pedindo-lhe que a aceitasse e que a utilizasse para o fim que quisesse, acrescentando que o Marquês, seu pai, o indenizaria assim que regressasse à Espanha. Depois, com o pretexto de tratar de algum negócio, retirou-se e Cristóvão nunca mais o viu. Apesar de todas as suas indagações sobre o estrangeiro, nunca conseguiu obter qualquer informação a seu respeito. Ninguém, nem em Louvain nem na Espanha, tinha visto ou conhecido um jovem que correspondesse à sua descrição. Quanto à soma de dinheiro, era exatamente a quantia de que o piedoso Cristóvão necessitava para fazer face às despesas até à chegada das suas cartas, e esse dinheiro nunca mais foi reclamado à sua família.

Estava, por isso, convencido de que o Céu tinha feito um milagre em seu favor e tinha enviado em seu auxílio uma daquelas almas que ele próprio tinha aliviado com as suas orações e esmolas. Esta opinião foi confirmada pelo Papa Clemente VIII, a quem contou o fato quando foi a Roma receber as Bulas de elevação ao Episcopado. Este Pontífice, impressionado com as circunstâncias extraordinárias do caso, aconselhou-o a dar a conhecer o fato a todos para a edificação dos fiéis; considerou-o como um favor do Céu, que provava quão preciosa é, aos olhos de Deus, a caridade para com os defuntos.

Tal é a gratidão das almas santas que deixaram este mundo, que elas a testemunham até mesmo pelos favores que lhes foram concedidos enquanto ainda estavam nesta vida. Conta-se nos Anais dos Frades Pregadores que, entre os que foram receber o hábito das mãos de São Domingos em 1221, havia um advogado que abandonara a sua profissão em circunstâncias extraordinárias. Estava unido por laços de amizade a um jovem de grande piedade, a quem assistiu caridosamente durante a doença de que morreu. Isto foi suficiente para levar o falecido a obter para ele o maior de todos os benefícios, o da conversão e vocação à vida religiosa. Cerca de trinta dias depois da sua morte, apareceu ao advogado e implorou a sua ajuda, porque estava no Purgatório. 'Os teus sofrimentos são muitos?' - perguntou ao seu amigo. 'Ai de mim!' - respondeu este último - 'se toda a terra, com suas florestas e montanhas, estivesse em chamas, não formaria uma fornalha como aquela em que estou mergulhado'. Tomado de medo, a sua fé reanimou-se e, pensando apenas na sua própria alma, perguntou: 'Em que estado me encontro aos olhos de Deus?' 'Num mau estado' - respondeu a alma - 'e numa profissão perigosa'. 'Então, o que é que eu devo fazer? Que conselho me dás?' 'Abandona o mundo perverso em que estás envolvido e ocupa-te apenas com os assuntos da tua alma'. O advogado, seguindo este conselho, deu todos os seus bens aos pobres e tomou o hábito de São Domingos.

Vejamos como um santo religioso da Companhia de Jesus manifestou a sua gratidão, mesmo depois da morte, ao médico que o assistiu na sua última doença. Francisco Lacci, Irmão Coadjutor, morreu no Colégio de Nápoles em 1598. Era um homem de Deus, cheio de caridade, paciência e terna devoção para com a Santíssima Virgem. Algum tempo depois de sua morte, o Dr. Verdiano entrou na igreja do Colégio para assistir à missa, antes de iniciar as suas visitas. Era o dia em que se celebravam as exéquias do rei Filipe II, falecido quatro meses antes. Quando, ao sair da igreja, se preparava para levar a água benta, aproximou-se um religioso e perguntou-lhe por que razão estava preparado o catafalco e em intenção de quem era a missa a ser celebrada. 'É a missa para o rei Filipe II' - respondeu ele.

Mas, ao mesmo tempo, Verdiano ficou espantado com o fato de um religioso fazer tal pergunta a um desconhecido, e não distinguindo as feições do seu interlocutor na obscuridade do lugar onde se encontrava, perguntou-lhe quem era. 'Sou' - respondeu ele - 'o Irmão Lacci, a quem o senhor assistiu na minha última doença'. O médico olhou-o atentamente, reconhecendo então as feições do religioso. Tomado de espanto, disse: 'Mas tu morreste dessa doença! Então estás a sofrer no Purgatório e vens pedir os nossos sufrágios?' 'Bendito seja Deus, já não tenho dores nem sofrimentos. Não preciso dos vossos sufrágios. Estou nas alegrias do Paraíso'. 'E o rei Filipe, também já está no Paraíso?' 'Sim, ele está lá, mas colocado tão abaixo de mim quanto foi elevado acima de mim na Terra. Quanto ao senhor, Dr. Verdiano, onde pensa fazer a sua primeira visita médica hoje?' Tendo Verdiano respondido que ia atender uma certa pessoa, que estava perigosamente doente, Lacci avisou-o para se precaver de um grande perigo que o ameaçava à porta da casa que ele ia visitar. De fato, o médico encontrou ali uma grande pedra disposta em posição tão perigosa, que tendia a se deslocar a qualquer momento, de modo a feri-lo mortalmente. Esta circunstância material parece ter sido concebida pela Providência para provar a Verdiano que ele não tinha sido vítima de uma ilusão.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog

sexta-feira, 18 de outubro de 2024

O ROSÁRIO NOSSO DE CADA DIA (XV)

  

QUINTO MISTÉRIO GLORIOSO: A COROAÇÃO DE NOSSA SENHORA

'Apareceu em seguida um grande sinal no céu: uma Mulher revestida do sol, a lua debaixo dos seus pés e na cabeça uma coroa de doze estrelas (Ap 12,1) ... Em mim se acha toda a graça do caminho e da verdade, em mim toda a esperança da vida e da virtude. Aquele que me ouve não será humilhado, e os que agem por mim não pecarão. Aqueles que me tornam conhecida terão a vida eterna' (Eclo 24, 25.30-31).

Nós vos oferecemos, Senhor Jesus, este mistério em honra da gloriosa Coroação de Nossa Senhora como rainha do Céu e da Terra e vos pedimos, pela intercessão da vossa Mãe Santíssima, a graça da perseverança na virtude e a coroa da vitória, para nós, para nossos benfeitores e para todos os justos de Deus.

Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai, Ó meu Jesus...

ORAÇÃO A SÃO JOSÉ PELA PUREZA DE CORAÇÃO

 

Ó glorioso São José, pai e protetor das virgens, guarda fiel a quem Deus confiou Jesus, a própria inocência, e Maria, a Virgem das virgens; sob o vosso eficaz auxílio, em nome de Jesus e de Maria, ajudai-me a ser puro em pensamento, palavras e ações, imitando a vossa própria santa pureza. Que o vosso profundo senso de modéstia esteja refletido na minha conduta externa. Protegei os meus olhos, janelas da minha alma, de qualquer coisa que possa ofuscar o brilho de um coração puro e casto. Conservai o meu coração isento de toda impureza para que eu possa, agora e sempre, servir  fielmente a Jesus e a Maria. Amém.

quinta-feira, 17 de outubro de 2024

O ROSÁRIO NOSSO DE CADA DIA (XIV)

 

QUARTO MISTÉRIO GLORIOSO: A ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA

'Desde o início, antes de todos os séculos, ele me criou, e não deixarei de existir até o fim dos séculos; e exerci as minhas funções diante dele na casa santa... Lancei raízes no meio de um povo glorioso, cuja herança está na partilha de meu Deus; e fixei minha morada na assembleia dos santos... Sou a mãe do puro amor, do temor (a Deus), da ciência e da santa esperança...' (Eclo 24,14.16.24).

Nós vos oferecemos, Senhor Jesus, este mistério em honra da gloriosa Assunção de Nossa Senhora e vos pedimos, pela intercessão da vossa Mãe Santíssima, a graça de uma verdadeira devoção à Virgem Maria, para que possamos viver e morrer sob a sua santa proteção.

Pai Nosso, 10 Ave Marias, Glória ao Pai, Ó meu Jesus...

SOFRER E PERDOAR

Como é doce a paciência dos santos! Sabem sofrer e sabem perdoar! Um homem perverso e cruel atirou com violência uma pedra que foi ferir gravemente o santo e pobrezinho São Bento Labre. Inclinou-se humildemente o santo, tomou a pedra, beijou-a e colocou-a respeitosamente num muro do caminho.

Prosseguiu a viagem, a rezar todo o tempo pelo seu agressor. Que doçura e paciência! Isto é ser cristão, é ser verdadeiro discípulo de Jesus Cristo! Quando muitas pedras de contradições, palavras duras e injúrias nos forem atiradas, fiquemos tranquilos. Oremos pelos que nos perseguirem. É um meio excelente para recuperar a calma e dominar esses instintos de cólera e orgulho que não nos deixam em paz.

Um dia Santa Isabel recebeu uma afronta. A injúria a feriu no âmago do coração. Sentiu-se perturbada e correu aos pés de Nosso Senhor. Fez violência ao coração e começou penosamente a rezar pelos que a insultaram, dizendo:
- 'Meu Jesus, dai aos que me insultaram um benefício, uma graça que corresponda a cada injúria'.

Quando assim rezava, Nosso Senhor lhe disse:
- 'Nunca me fizeste orações mais agradáveis e belas do que estas. Penetraram tuas súplicas até o fundo de meu coração. Perdoo, minha filha, por isso, todos os pecados de toda a tua vida'.
Tenhamos a doce certeza de que assim nos falará Nosso Senhor, se soubermos, como Ele, sofrer e perdoar!

(Excertos da obra 'Breviário da Confiança', do Monsenhor Ascânio Brandão)