domingo, 7 de julho de 2024

EVANGELHO DO DOMINGO

  

'Os nossos olhos estão fitos no Senhor: tende piedade, ó Senhor, tende piedade!' (Sl 122)

Primeira Leitura (Ez 2,2-5) - Segunda Leitura (2Cor 12,7-10) -  Evangelho (Mc 6,1-6)

  07/07/2024 - DÉCIMO QUARTO DOMINGO DO TEMPO COMUM

31. OS IRMÃOS E AS IRMÃS DE JESUS


Na pequena Nazaré, Jesus tinha sido apenas o filho de um carpinteiro, o filho de Maria e José. Ali viveu por cerca de trinta anos, desde o retorno da fuga dos seus pais para o Egito, após a morte de Herodes (Mt 2, 15-23) até o início de sua vida pública, com o batismo no Jordão (Mt 3, 13-17). Ali vivera no anonimato de uma família simples, como uma pessoa comum e os seus conterrâneos não tiveram dele, durante todo este tempo, nenhuma ocorrência extraordinária, nenhuma referência de sua manifestação como o Filho de Deus. E, desde algum tempo, Jesus partira de Nazaré para algum lugar alhures.

E, certamente, cada vez com maior vigor, chegavam a eles notícias da pregação pública de Jesus por toda a Galileia, as suas parábolas, os seus milagres, os seus feitos extraordinários, a manifestação grandiosa de uma doutrina messiânica que levaria à redenção e à salvação de toda a humanidade. E, mais certamente ainda, tais notícias deveriam produzir neles impulsos de incredulidade e estranheza: 'Este homem não é o carpinteiro, filho de Maria e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? Suas irmãs não moram aqui conosco?’ (Mc 6,3). O ceticismo natural daquela gente era imposto por uma dualidade factual: Jesus tinha sido 'uma pessoa normal' entre eles e, agora, em pouco tempo, assumira uma referência profética e messiânica fora de Nazaré, muito além da capacidade de entendimento possível daquelas pessoas que haviam convivido diariamente com Ele durante tantos anos...

E eis que Jesus retorna agora à Nazaré de quase todos os seus dias; quanta expectativa e admiração certamente não deveriam estar aflorando naquela gente, quando Jesus entrou na sinagoga da cidade e começou a pregar as Escrituras. Quanto júbilo de amor e caridade não terá se revestido o Senhor, de modo tão especial, para ensinar a sã doutrina àqueles homens e mulheres de sua terra de predileção? De uma certa forma ali, mais do que em qualquer outro lugar, a dualidade humana e divina de Jesus se manifestava de forma tão sublime e particular mas, contradição das contradições, uma será julgada para anular a outra! Movidos pela incredulidade, pela inveja, pelo arbítrio humano da pura má vontade, aqueles homens se fecharam em suas experiências humanas e negaram o milagre da fé: 'E ficaram escandalizados por causa dele' (Mc 6, 3).

Mesmo entre os seus familiares mais próximos, os 'irmãos e irmãs de Jesus', houve uma resistência muito além do ceticismo inicial, fruto dessa insustentável condição humana de julgar pelas meras aparências e com base apenas na lógica fria das coisas palpáveis e racionais. Neste contra-senso geral, Nazaré perdeu a primazia da graça e Jesus não pôde ali realizar milagre algum e passou a pregar, então, nos povoados vizinhos. Jesus chegou a se admirar com a cegueira espiritual de sua gente e lançou sobre eles o epíteto que perpassou pelos tempos: 'Um profeta só não é estimado em sua pátria, entre seus parentes e familiares' (Mc 6, 4). Nos escombros da lógica fria, a fé não pode se erguer grandiosa e nem fincar raízes na terra nua da incredulidade pura e obstinada. Estes são aqueles que Jesus há de nomear mais tarde: 'Nunca vos conheci' (Mt 7, 23). Os que creem, os que realmente se abrem ao milagre da fé, estes são, verdadeiramente, 'os irmãos e as irmãs de Jesus'.

sábado, 6 de julho de 2024

O MILAGRE EUCARÍSTICO DE CASCIA

Em 1330, na região de Cascia (Itália), um sacerdote foi chamado às pressas para ministrar a Sagrada Eucaristia a um homem doente em estado terminal. Atendendo rapidamente ao pedido, o sacerdote resolveu, de forma inesperada e totalmente irreverente, levar a hóstia consagrada destinada ao doente guardada entre as páginas do seu breviário. Na casa do doente, ao abrir o breviário para ministrar ao doente a comunhão, descobriu estupefato que a hóstia não apenas se transformara num coágulo único, mas se desmanchava em grandes manchas de sangue em ambas as páginas do breviário entre as quais havia sido mantida.

Sob forte comoção e arrependimento, o sacerdote dirigiu-se imediatamente para um mosteiro agostiniano próximo de Siena, ao encontro do Frei Simone Fidati, sacerdote de piedade e santidade reconhecidas, para narrar os fatos e pedir a sua confissão. O breviário foi então recolhido e as duas páginas, manchadas de sangue e com dimensões de 52mm x 44mm, foram preservadas e destinadas à veneração interna no mosteiro. 


Em 1389, o papa Bonifácio IX confirmou a autenticidade do milagre, concedendo indulgência especial ao culto da relíquia em 1401. Ao longo dos anos, um outro evento extraordinário transcorreu com as manchas de sangue diluídas nas páginas do breviário: elas passaram a conformar a figura de um rosto humano, reproduzindo a imagem de um homem com barba. A relíquia foi transferida do mosteiro agostiniano para a capela inferior da Basílica de Santa Rita em Cascia em 1930, onde se encontra atualmente, mantidas em um tabernáculo de cristal ladeado por dois painéis de mármore, que simulam as páginas do breviário contendo as imagens formadas do rosto humano.


sexta-feira, 5 de julho de 2024

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

Participem vossos filhos da ciência de Cristo. Aprendam que grande valor tem para Deus a humildade, o poder da casta caridade junto de Deus, como é bom e imenso seu temor, protegendo a todos que nele se demoram na santidade de um coração puro. Porque ele é o perscrutador dos pensamentos e resoluções da mente. Seu Espírito está em nós, e, quando quer, retira-o. A fé em Cristo tudo confirma. Ele, pelo Espírito Santo, nos incita: 'Vinde, filhos, ouvi-me; ensinar-vos-ei o temor do Senhor. Qual é o homem que quer a vida e deseja ver dias bons? Afasta tua língua do mal e não profiram teus lábios a mentira. Desvia-te do mal e faze o bem. Busca a paz e persegue-a' (Sl 33,12-15). Misericordioso em tudo, o Pai benigno tem amor pelos que o temem, concede com bondade e doçura suas graças àqueles que se lhe aproximam com simplicidade. Por isso não sejamos fingidos e nem insensíveis aos seus dons gloriosos.

(São Clemente I)

quinta-feira, 4 de julho de 2024

O DOGMA DO PURGATÓRIO (LXXXIV)

 

Capítulo LXXXIV

Razões de Justiça - O Zelo de Santa Catarina de Sena pela Salvação da alma do seu Pai Jacomo

Santa Catarina de Sena deixou-nos um exemplo semelhante. É assim relatado pelo seu biógrafo, o Beato Raimundo de Cápua. 'A serva de Deus' - escreve ele - 'tinha um zelo ardente pela salvação das almas. Falarei primeiro do que ela fez em favor da alma do seu pai, Jacomo. Este homem íntegro já tinha notado a santidade da sua filha e estava cheio de respeitosa ternura para com ela; aconselhava todos os da sua casa a não se oporem a ela em nada, mas a deixarem em perfeita liberdade na prática das suas boas obras. Assim, o afeto que unia pai e filha aumentava de dia para dia. Catarina rezava constantemente pela salvação do seu pai; Jacomo tinha um santo prazer nas virtudes de sua filha, esperando, por meio dos seus méritos, obter o favor de Deus'.

A vida de Jacomo aproximou-se do fim e ele foi confinado à cama por uma doença perigosa. Ao ver o seu estado, a sua filha, como era seu costume, entregou-se à oração, suplicando ao seu Esposo Celeste que curasse aquele que ela amava tão ternamente. Ele respondeu que Jacomo estava à beira da morte e que viver mais tempo não lhe seria proveitoso. Catarina foi então ter com o seu pai e encontrou-o tão perfeitamente resignado a deixar este mundo que, sem qualquer pesar, agradeceu a Deus por isso de todo o coração.

Mas o seu amor filial não se contentou com isso; ela dedicou-se então vivamente à oração, a fim de obter de Deus, fonte de toda a graça, que concedesse ao seu pai, não apenas o perdão de todas as suas faltas, mas também que, na hora da sua morte, ele pudesse ser admitido no Céu, sem sequer passar pelas chamas do Purgatório. Recebeu a resposta divina que a Justiça não podia sacrificar os seus direitos e que uma alma devia ser perfeitamente pura para entrar na glória do Paraíso. 'O teu pai' - disse Nosso Senhor - 'levou uma boa vida no estado de casado, e fez muito que foi muito agradável aos meus olhos; acima de tudo, a sua conduta para contigo foi muito agradável para mim; mas a minha Justiça exige que a sua alma passe pelo fogo, a fim de a purificar dos pecados que incorreu no mundo'. 'Ó meu amado Salvador' - respondeu Catarina - 'como posso suportar a ideia de ver aquele que me alimentou, que me criou com tanta ternura, que foi tão bom para mim durante toda a sua vida, possa estar atormentado em meio àquelas chamas terríveis? Suplico à Vossa Bondade Infinita que não permita que a sua alma deixe o corpo até que, de uma forma ou de outra, tenha sido tão perfeitamente purificada que não tenha necessidade de passar pelos fogo do Purgatório'.

Admirável condescendência da graça! Deus cedeu à oração e ao desejo da sua criatura. As forças de Jacomo estavam esgotadas, mas a sua alma não podia partir enquanto durasse o conflito entre Nosso Senhor, que alegava a sua Justiça, e Catarina, que implorava a sua Misericórdia. Por fim, Catarina retomou: 'Se eu não posso obter esta graça sem satisfazer a tua Justiça, que essa Justiça se exerça sobre mim; estou pronta a sofrer por meu pai tudo o que a tua Bondade quiser enviar-me'. Nosso Senhor consentiu. 'Aceitarei a tua proposta' - disse Ele - 'por causa do teu amor por mim, isento a alma do teu pai de toda a expiação, mas tu sofrerás, enquanto viveres, a dor que lhe estava destinada'. Cheia de alegria, Catarina gritou: 'Obrigada pela tua graça, Senhor, e que seja feita a tua vontade!'

A santa retornou imediatamente para junto do seu pai, que acabava de entrar em agonia. Encheu-o de coragem e alegria, dando-lhe, da parte de Deus, a certeza da sua salvação eterna, e não o deixou até que se expirasse a sua alma. No mesmo momento em que a alma do seu pai se separou do corpo, Catarina foi acometida de dores violentíssimas, que permaneceram até sua morte, sem lhe permitir um só momento de repouso. Ela mesma - acrescenta o Beato Raimundo de Cápua - assegurou-me muitas vezes isto e, de fato, tal era evidente para todos os que a viam. Mas a sua paciência era maior do que a sua doença. Tudo o que contei, me foi transmitido por Catarina quando, comovido ao ver os seus sofrimentos, lhe perguntei a causa deles. Não me esqueço de dizer que, no momento em que o seu pai expirou, a ouviram gritar, com o rosto radiante de alegria e um sorriso nos lábios: 'Deus seja louvado! Meu querido pai, como eu gostaria de morrer assim!'. Durante a celebração das exéquias fúnebres, quando todos estavam a chorar, Catarina parecia transportada de alegria. Consolava a mãe e toda a gente como se não tivesse sido afetada pela morte do pai. Era porque tinha visto aquela alma querida sair triunfante da prisão do corpo e passar, sem qualquer obstáculo, para a bem-aventurança eterna. Essa visão inundou-a de consolação, porque pouco tempo antes ela própria tinha provado as alegrias da luz eterna.

Admiremos aqui a sabedoria da Providência. A alma de Jacomo poderia certamente ter sido purificada de outra maneira e ter sido imediatamente admitida no Céu, como o bom ladrão que confessou o nosso Salvador na Cruz. Mas Deus quis que a sua purificação fosse realizada por meio dos sofrimentos de Catarina, como ela própria tinha pedido, e isto não para a experimentar, mas para aumentar e favorecer os seus méritos e a sua coroa de glória. Era conveniente que esta santa donzela, que tão ardentemente amava a alma do seu pai, recebesse alguma recompensa pelo seu afeto filial; e como ela tinha preferido a salvação da alma dele à do seu próprio corpo, o seu sofrimento corporal contribuiu enormemente para a felicidade da sua alma. Assim, falava sempre dos seus doces e queridos sofrimentos. E tinha razão, porque essas aflições aumentavam a doçura da graça nesta vida e as delícias da glória na outra. Confiava-me que, muito tempo depois da sua morte, seu pai Jacomo vinha continuamente agradecer-lhe a felicidade que lhe tinha proporcionado. Revelou-lhe muitas coisas ocultas, avisou-a das ciladas do demônio e preservou-a de todos os perigos.

Tradução da obra: 'Le Dogme du Purgatoire illustré par des Faits et des Révélations Particulières', do teólogo francês François-Xavier Schouppe, sj (1823-1904), 342 p., tradução pelo autor do blog

quarta-feira, 3 de julho de 2024

TESOURO DE EXEMPLOS (346/350)

 

346. A GLÓRIA VÃ DESTE MUNDO

Napoleão, para conquistar um reino, sofreu frio, cansaço, sono e expôs-se muitas vezes aos perigos da guerra. Seu reinado foi como um meteoro de um instante e ele morria derramando lágrimas de desengano, na ilha de Santa Helena, no meio do mar.

César, suspirando pelo império de Roma, combateu árduas batalhas nas Gálias e apenas alcançou o umbral do sonhado império, caiu apunhalado aos pés da estátua de Pompeu.

Alexandre combateu com uma força de vontade jamais vista na terra; e quando conseguiu o domínio do mundo, colheu-o a morte e, sem ele, esfacelou-se o seu império.

Ora, se os filhos do século sabem sofrer indizíveis tormentos, superar terríveis dificuldades para alcançar o reino de um dia; por que os filhos da luz não hão de saber suportar pequenos sofrimentos, combater as paixões e repelir a lisonja do mundo para conquistar um reino eterno de felicidade?

347. EIS AQUI OS MEUS TESOUROS

Quando levavam à morte o diácono São Lourenço, os soldados, sendo informados de que ele era o tesoureiro do bispo, começaram a maltratá-lo para que lhes contasse onde havia escondido os tesouros. O santo diácono mandou chamar os pobres, com os quais repartira todos os bens, e disse aos soldados: 'Eis aqui os meus tesouros'. Tinha razão, porque tudo o que se dá aos pobres, se converte em tesouros para a eternidade.

348. A VERDADEIRA CARIDADE

Qualquer amor não é caridade. Amor de caridade era aquele de Santa Joana de Chantal, que curava os enfermos, levava-os à sua casa e beijava-lhes as chagas. 'Mas o que fazes?' - perguntaram-lhe um dia. 'Beijo as chagas de Jesus'. Se alguém ama a uma pessoa, porque é rica e poderosa ou porque é capaz de socorrê-lo e protegê-lo, o seu amor não é caridade; é interesse. Caridade é amar ao próximo como a si mesmo por amor de Deus.

349. PEDIR A VOCAÇÃO PARA OS FILHOS

Os pais podem pedir a Deus a vocação para os seus filhos. Durante trinta anos rezava uma mãe de família para que Deus concedesse aos seus filhos a vocação religiosa, e Deus a ouviu. Teve cinco filhas freiras e seis filhos padres, dentre os quais dois arcebispos e um cardeal, o célebre Vaughan, falecido em 1903.

350. O PADRE NÃO SE CASA

Um rei da Escócia, antepassado da dinastia Stuart, tinha grande admiração por São Columbano, e chegou a oferecer-lhe sua própria filha em matrimônio.

Agradeceu-lhe o santo a distinção, porém não a aceitou. Admirou-se o rei de que fosse rejeitada a sua filha, famosa por sua formosura e distinção; mas o santo respondeu-lhe que preferia dedicar toda a vida como sacerdote de Cristo, e o sacerdote renuncia a formar família própria, para poder constituir uma grande família espiritual com todos os fiéis.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos', do Pe. Francisco Alves, 1958; com adaptações)

terça-feira, 2 de julho de 2024

POR QUE DEUS PERMITE TUDO ISSO?

É um desígnio tremendo da Providência Divina que seres humanos particularmente maus possam ter sido projetados na escala da humanidade pecadora. Todos somos maus, todos somos particularmente nada. Mas mesmo para o nada que somos parece algo absolutamente imcompreensível o mal que incorpora certas pessoas, certos grupos, certas ideologias. A questão comum que se impõe é certamente a seguinte: Por que Deus permite tudo isso?

A inteligência e a compreeensão humanas flutuam como névoa rasteira no abismo da sabedoria divina. Deus é. Aquele que tem o infinito de tudo como medida sabe e permite tudo isso. O nada se compraz em fazer perguntas sem respostas humanas ao Deus de tudo. 

Mas o fato concreto é que o mal subsiste e se avoluma como avalanche onde o bem se subtrai e se torna espuma. O bem como reflexo do bem é sempre uma graça. O mal que torna sementes podres em frutos podres é o exercício cotidiano da iniquidade. Mas onde o bem confronta o mal - como o trigo que refreia o joio alastrante - aí está a graça e a sabedoria da graça. 

Há muitos bons fazendo o bem isentos do mal deste vale de lágrimas. Não é fácil, não é simples, não é o bastante. Há outros tantos - não tantos assim - que fazem guerra contínua contra o mal imperante, sem tréguas ou repouso. Alguns são os mártires dos nossos dias, muitas vezes tombados no mais completo e obscuro anonimato. Outros são repudiados publicamente, tem as suas reputações aniquiladas, são atacados e expostos a todo tipo de injúria e de calúnia. Outros são simplesmente condenados em praça pública como ignorantes, retrógrados ou propagadores de culturas de ódio e preconceitos.

E a maioria dos homens bons - uma imensa maioria - cala e consente, consente e se acovarda. E, então, se perguntam na insensatez de apenas parecerem homens bons: Por que Deus permite tudo isso?