sexta-feira, 12 de setembro de 2025

SOBRE AS ÚLTIMAS QUATRO COISAS (II)

 

PARTE I - SOBRE A MORTE

II. Sobre os Ataques de Satanás na Hora da Morte

Embora a morte seja em si mesma muito amarga, sua amargura é ainda mais intensificada pela lembrança vívida dos pecados de nossa vida passada, pelo pensamento do julgamento que está por vir, da eternidade que temos diante de nós e pelos ataques de Satanás. Essas quatro coisas enchem a alma de tal terror que ela inevitavelmente se desesperaria, a menos que fosse fortalecida pela ajuda de Deus. Vamos entrar em algumas explicações sobre cada uma dessas quatro coisas e também indicar alguns meios de combater os medos que elas inspiram.

Com relação aos ataques de Satanás, saiba que o Deus totalmente justo permite que ele tenha grande poder para nos atacar na hora da morte; não para nossa perdição, mas para nossa provação. Antes de expirar, o cristão ainda tem que provar que nada pode fazê-lo abandonar seu Deus. Por essa razão, o inimigo maligno emprega todo o poder que recebeu e usa todas as suas forças contra o homem quando ele está morrendo, na esperança de fazê-lo pecar e empurrá-lo para o inferno. Durante toda a nossa vida, ele nos ataca ferozmente e não negligencia nenhum meio pelo qual possa nos enganar. Mas todas essas perseguições não se comparam ao ataque final com o qual ele se esforça para nos vencer no fim. Então ele se enfurece no limite, como um leão rugindo, procurando quem possa devorar.

Isso aprendemos na seguinte passagem do Apocalipse: 'Ai da terra e do mar, porque o diabo desceu a vós, tendo grande ira, sabendo que tem pouco tempo' (Ap 12,12). Essas palavras têm uma aplicação especial para os moribundos, contra os quais o diabo concebe uma grande ira e a quem ele faz todos os esforços para seduzir. Pois ele sabe muito bem que, se não os colocar sob seu poder agora, nunca mais terá a chance de fazê-lo. Ouça o que São Gregório diz sobre esse ponto: 'Considerem bem como é terrível a hora da morte e como será assustadora a lembrança de nossas más ações naquele momento. Pois os espíritos das trevas recordarão todo o mal que nos fizeram e nos lembrarão dos pecados que cometemos por sua instigação. Eles não irão apenas ao leito de morte dos ímpios, mas estarão presentes com os eleitos, esforçando-se para descobrir algo pecaminoso de que possam acusá-los. Ai de nós! Como será para nós, mortais infelizes, naquela hora, e o que poderemos dizer em nossa defesa, vendo quantos são os pecados que nos serão imputados? O que poderemos responder aos nossos adversários, quando eles colocarem todos os nossos pecados diante de nós, com o objetivo de nos levar ao desespero?'

Os espíritos malignos tentarão sua infeliz vítima no momento da morte em vários pontos, mas especialmente no que diz respeito aos pecados em que ela mais frequentemente caiu. Se durante sua vida ela nutriu ódio por alguém, eles conjurarão diante de seus olhos moribundos a imagem dessa pessoa, relembrando tudo o que ela fez para prejudicá-la, a fim de reavivar a chama do ódio contra esse inimigo ou acendê-la novamente. Ou, se alguém transgrediu contra a pureza, eles lhe mostrarão o cúmplice de seu pecado e se esforçarão para despertar a paixão culpada que sentia por essa pessoa. Se ele foi atormentado por dúvidas sobre a fé, eles lhe lembrarão o artigo de crença que ele tinha dificuldade em aceitar, representando-o como falso. Se um homem tem tendência à pusilanimidade, os espíritos malignos a incentivarão nela, para que possam roubar-lhe a esperança da salvação. O homem que pecou por orgulho e se gabou de suas boas obras, procurarão enganar com bajulação, assegurando-lhe que ele está em alta graça com Deus e que tudo o que fez não pode deixar de garantir-lhe um lugar no céu. Novamente, se durante sua vida um homem cedeu à impaciência, permitindo-se ficar zangado e irritado com cada ninharia, eles fazem com que sua doença pareça mais incômoda para ele, para que se torne impaciente e se rebele contra Deus por ter lhe enviado uma doença tão dolorosa.

Ou, se ele foi indiferente e pouco devoto, sem fervor na oração ou assiduidade em seus exercícios religiosos, eles tentarão manter em sua alma esse estado de apatia, sugerindo-lhe que sua fraqueza física é grande demais para permitir que ele se junte às orações que seus familiares fazem por ele. Finalmente, eles tentarão aqueles que levaram uma vida ímpia e repetidamente caíram em pecado mortal, levando-os ao desespero, representando suas transgressões como sendo tão grandes que estão além do perdão. Em uma palavra, os espíritos do mal atacam os mortais no momento da morte com mais ferocidade em seu ponto mais vulnerável, assim como um general habilidoso atacará uma fortaleza pelo lado onde percebe que as muralhas são mais fracas.

Mas os demônios nem sempre se limitam a tentar o homem em relação às suas principais falhas e defeitos predominantes; frequentemente o tentam a cometer pecados dos quais ele até então não era culpado. Pois esses inimigos astutos não poupam esforços para enganar os moribundos e, se falham de uma maneira, tentam ter sucesso de outra. Essas tentações não são de caráter comum. Às vezes são tão violentas que é impossível para os mortais fracos resistir a elas sem ajuda sobrenatural. Se tudo o que alguém em boa saúde pode fazer é resistir aos ataques do demônio, e mesmo assim muitas vezes é vencido por eles, quão difícil deve ser para alguém enfraquecido pela doença lutar contra inimigos tão poderosos!

Sobre este ponto, um escritor piedoso disse: 'A menos que o moribundo, antes de sua última doença, tenha se armado contra esses ataques e se acostumado a lutar contra seus adversários espirituais, ele tem poucas chances de prevalecer contra eles no momento da morte. Se o fizer, será apenas com a ajuda do Deus Todo-Poderoso, de Nossa Senhora, de seu anjo da guarda ou de um dos santos. Pois nosso Deus misericordioso e seus anjos e santos abençoados não abandonam o cristão na hora de sua maior necessidade; eles correm em seu auxílio, isto é, desde que ele seja digno de sua ajuda'. A fim de se preparar antes da última doença para combater essas tentações, é aconselhável recitar com a devida devoção a seguinte oração.

ORAÇÃO

Ó Jesus, compassivo Redentor da humanidade, recordando a tripla tentação que sofrestes do inimigo maligno vos  rogo, pela vossa gloriosa vitória sobre ele, que estejais ao meu lado no meu último conflito e me fortaleceis contra todas as suas tentações. Sei que, com minhas próprias forças, não posso lutar contra um inimigo tão poderoso e certamente serei vencido, a menos que Vós e vossos santos abençoados, me concedais a ajuda oportuna. Portanto, imploro sinceramente o vosso auxílio e a dos vossos santos, e proponho armar-me da melhor maneira possível com a vossa graça, para enfrentar as tentações que me aguardam. Prometo pois, diante de Vós, dos santos anjos e dos santos abençoados, que nunca me exporei voluntariamente a qualquer tentação, seja ela de que natureza for, mas com a ajuda da vossa graça, hei de combatê-las com todas as minhas forças. Amém.

(Excertos da obra 'The Four Last Things - Death, Judgment, Hell and Heaven', do Pe. Martin Von Cochem, 1899; tradução do autor do blog)


quinta-feira, 11 de setembro de 2025

PALAVRAS DE SALVAÇÃO

'Engana-se nos seus cálculos aquele que se afadiga aos domingos, com a ideia de que vai ganhar mais dinheiro ou trabalhar mais! Dois ou três francos compensam o mal que faz a si próprio violando a lei de Deus? Estais convencidos de que tudo depende do vosso trabalho; e eis que surge uma doença, um acidente, pouca coisa: uma tempestade, uma geada... Trabalhai, não pelo alimento que perece, mas por aquele que dura para a vida eterna. Que ganhais em trabalhar aos domingos? Deixareis a Terra como está quando partirdes: nada levareis convosco. A nossa primeira finalidade é chegar a Deus; é só para isso que estamos neste mundo. Meus irmãos, temos de morrer no domingo para ressuscitar na segunda-feira. 

O domingo pertence a Deus: é o seu dia, o Dia do Senhor. Ele fez todos os dias da semana, e podia ficar com todos. Mas deu-nos seis, reservando para si somente o sétimo!'
(Santo Cura d'Ars)

OS PAPAS DA IGREJA (XXXVII)



quarta-feira, 10 de setembro de 2025

ORAÇÃO: 'CRUX FIDELIS'

Crux Fidelis é um hino litúrgico de celebração da Paixão de Cristo, inserido no contexto de uma obra bem maior, cuja autoria é geralmente creditada a São Venâncio Fortunato, bispo de Poitiers. O hino é cantado na Adoração da Cruz na Sexta-feira Santa e no Ofício Divino durante a Semana Santa e nas festas da Santa Cruz. A autoria da obra tem sido equivocadamente atribuída a Dom João IV, Rei de Portugal, por este ter criado um famoso arranjo policromático para a peça, mas não a sua composição original.


Crux fidelis, inter omnes arbor una nobilis: nulla silva talem profert, fronde, flore, germine. Dulce lignum, dulces clavos, dulce pondus sustinet.

Pange lingua gloriosi lauream certaminis, et super crucis trophæo dic triumphum nobilem: qualiter Redemptor orbis immolatus vicerit.

Crux fidelis, inter omnes arbor una nobilis: nulla silva talem profert, fronde, flore, germine.

De parentis protoplasti Fraude Factor condolens, quando pomi noxialis in necem morsu ruit: Ipse lignum tune notavit, Damna lignus ut solveret.

Dulce lignum, dulces clavos, dulce pondus sustinet.

Aequa Patri Filioque,inclito Paraclito,sempiterna sit beatae Trinitati gloria, cuius alma nos redemit atque servat gratia.

Crux fidelis, inter omnes arbor una nobilis: nulla silva talem profert, fronde, flore, germine.

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Ó Cruz fiel, entre todas a árvore mais nobre: nenhum bosque produz igual, em ramagens, frutos e flores. 
Ó doce lenho, que os doces cravos e o doce peso sustentas.

Canta, ó língua, o glorioso combate [de Cristo] e, diante do troféu da Cruz, proclama o nobre triunfo: a vitória conseguida pelo Redentor, vítima imolada para o mundo.

Ó Cruz fiel, entre todas a árvore mais nobre: nenhum bosque produz igual, em ramagens, frutos e flores.

O Criador apiedado da maldição que ocorreu, quando do lenho vedado Adão o fruto mordeu, para curar o pecado, o mesmo lenho escolheu!

Ó doce lenho, que os doces cravos e o doce peso sustentas.

Glória e poder à Trindade, ao Pai e ao Filho louvor, honra ao Espírito Santo, eterna glória ao Senhor, que nos salvou pela graça e nos reuniu no amor

Ó Cruz fiel, entre todas a árvore mais nobre: 
nenhum bosque produz igual, em ramagens, frutos e flores.

terça-feira, 9 de setembro de 2025

TESOURO DE EXEMPLOS II (35/38)


35. CATÓLICOS DE BATISMO

Há três classes de católicos, a saber: católicos de batismo, isto é, homens de que se sabe que são católicos porque podem apresentar uma certidão na qual consta que, um dia, foram levados à Igreja e batizados; fora disso, nem por suas crenças e nem por suas práticas, poderá alguém reconhecer que são católicos.

Há católicos domingueiros. Ao chegar o dia do Senhor, tomam o seu devocionário ou mesmo o seu missal, ou não levam nada, e vão à Igreja para ouvir missa tarde e rápida (sem sermão e nem instrução) e feito isso estão quites com Deus toda a semana.

Há católicos de todos os dias. Sabem que ninguém pode ser verdadeiramente católico, quando não o é todas as horas, e se não impregnam de espírito católico todas as suas obras, e se não se comportam como tais em toda ocasião, ordenando sua vida segundo a santa vontade de Deus.

Por que não havemos de ser católicos de verdade? Por que os católicos de batismo são legião, os domingueiros são muitos, e poucos, pouquíssimos, são os católicos de todos os dias?

36. COMO AS MODAS PEGAM

Certo dia, um mau caçador perseguía no juncal de uma lagoa numeroso bando de patos silvestres. Ao vê-lo, fugiram todos. Um, porém, ficou embaraçado e, sobre ele, disparou o caçador a sua carga de chumbos. O tiro pegou-o no rabo. As penas voaram pelos ares, sobrando só duas, tesas e ridículas, na cauda do pato. Teve vergonha de voltar deformado para o meio de seus companheiros, porquanto zombariam dele e de sua desgraça.

Fugiu, pois, para longe e, em sua vida errante, encontrou-se, um dia, junto de uma lagoa com outro bando de patos silvestres. Quando o viram chegar com aquelas duas únicas penas no rabo, os novos companheiros soltaram uma gargalhada e gritaram:
➖ Olhem este espantalho, de onde terá ele escapado?
Um dos patos mais velhos, porém, disse sisudamente:
➖ Pois olhem, parece-me um tipo interessante; talvez venha de Paris e quiçá seja por lá a última moda entre os patos.
Foram perguntar ao recém-chegado e o astuto (que ouvira a conversa) saiu galhardamente do apuro dizendo que, realmente, aquela era a última moda de Paris.
➖ E assenta-se admiravelmente - comentaram as patinhas mais novas. 

E dentro de poucos dias, essas patinhas (primeiro uma, depois as outras) foram arrancando as penas do rabo, deixando somente duas à moda do hóspede.

As patas-mães, a princípio, não gostaram muito da novidade; mas, pouco tempo depois, elas também arrancaram as penas do rabo e, pelos arredores da lagoa, só se viam patas sem as penas dos rabos. O pato ridículo triunfara sobre todo o grupo de patos.

Entre os homens, e mormente entre as mulheres, há muitas modas que se originaram à semelhança desta. Vieram através das modistas importadas de Paris ou do cinema semipagão. E como nos parecem ridículas! Quantos sacrifícios para servir à moda e quão poucos para agradar a Deus!

37.  A IGREJA INVENCÍVEL

Temeis pelo futuro da Santa Igreja, quando consideráis o ódio e o furor com que a combatem os seus inimigos? Ah! nao vos amedronteis! A história de ontem é a melhor garantia da história de hoje. Muito mais poderosos foram os inimigos da Igreja primitiva - plantinha tenra ainda - do que os perseguidores de hoje, quando ela - árvore frondosa e gigante - resiste impávida aos furacões. 

Vede o que sucedeu: quando Diocleciano foi desterrado e morreu como pobre velho desesperado... quando Galeno foi devorado pelos vermes e reconheceu num edito público a injustiça dos seus ataques... quando Maxêncio se afogou no Tibre... quando Maximino expirou no meio de dores atrozes como as que fizera sofrer aos cristãos... quando Licínio caiu sob as armas de Constantino...  

A Esposa de Cristo (a Igreja) mostrava-se jovem e triunfadora e saía das catacumbas para empreender suas conquistas vitoriosas, flutuando sobre a sua cabeça uma bandeira branca e azul, na qual estavam gravadas as palavras da eterna Verdade: 'As portas do inferno nunca prevalecerão contra ela!'

38. SALVEMO-NOS NA IGREJA

Os soldados cercam a fortaleza e estão ansiando por atacá-la.
➖ Soldados - brada o general, amanhã assaltaremos a fortaleza.
➖ Por onde, meu general?
➖ Pelo norte; estai prontos para cumprir as minhas ordens!

Todos se calam e preparam as armas. No dia seguinte, o general dá a ordem de assalto. Os soldados atiram-se como leões contra a muralha do norte e tomam a fortaleza. Alguns soldados, porém, por sua própria conta, preferiram atacar a fortaleza pelo sul e, porque desobedeceram as ordens do general, foram fuzilados no campo de batalha. Este é o poder do general; este é dever do exército.

Pois bem; a vida do homem sobre a terra é uma milícia. Somos soldados de um exército, cujo General é o próprio Deus. Viemos a este mundo sem outro fim do que este: conquistar o reino do Céu! Entretanto, Deus, o comandante supremo, nos diz: 'Fora da Igreja não há salvação!'

É inútil queremos conquistar o Céu de outra maneira com nossas próprias idéias e nossos próprios métodos. Seremos vencidos e castigados, se não empregarmos os meios e as armas que Jesus Cristo nos dá por meio da sua Igreja.

(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos' - Volume II, do Pe. Francisco Alves, 1960; com adaptações)

segunda-feira, 8 de setembro de 2025

AQUELA GOTA DE ÁGUA...


A gota de água, que o sacerdote, durante a eucaristia, coloca no cálice com vinho, possui um profundo significado litúrgico, representando a união da humanidade e da divindade de Cristo, simbolizando a união dos fiéis ao sacrifício eucarístico. Essa gota de água representa o povo de Deus e se unirá ao Sangue de Nosso Senhor, pois logo o vinho se transformará em Sangue no altar. Desta forma, somos partícipes da graça divina porque somos essa gota d'água imersa no meio da imensa onda da Graça Santificante de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ao unirem-se no cálice, a água e o vinho compõem juntos a humanidade e a divindade, a íntima associação da Igreja ao sacrifício de Cristo. Em cada missa, este mistério se renova e, assim, Nosso Senhor poderia ter santificado muitos outros mundos, gerações e gerações sem fim, muitíssimo mais do que aquelas que foram e que serão santificadas.

'A Eucaristia é também o sacrifício da Igreja. A Igreja, que é o corpo de Cristo, participa da oferta da sua Cabeça. Com Cristo, ela mesma é oferecida inteira. Ela se une à sua intercessão junto ao Pai por todos os homens. Na Eucaristia, o sacrifício de Cristo se torna também o sacrifício dos membros do seu Corpo. A vida dos fiéis, seu louvor, seu sofrimento, sua oração, seu trabalho, são unidos aos de Cristo e à sua oferta total, e adquirem assim um valor novo. O sacrifício de Cristo presente no altar dá a todas as gerações de cristãos a possibilidade de estarem unidos à sua oferta' (Catecismo da Igreja Católica, 1368).

'Se houver apenas água, sem vinho, nós estamos sozinhos, sem Cristo. E se houvesse só vinho sem água, estaria Cristo sozinho sem nós'

 (São Cipriano de Cartago)

OS PAPAS DA IGREJA (XXXVI)