39. COMO FAZ BEM A HUMILHAÇÃO
Bem poucos conhecem, mesmo de nome, São Telmo. Chamava-se, antes, Pedro González. Era muito moço, mas seu tio, o bispo de Palência, o fez cônego daquela catedral. Era o jovem cônego muito vaidoso e gostava demais das honras e dignidades. Sua vida contrastava com a de seus colegas que andavam escandalizados com a sua conduta.
Apesar disso, seu tio conseguiu que ele fosse eleito deão do cabido. A posse foi marcada para o dia de Natal. Chegado o dia, González vestiu um elegante traje cortesão e, montando um ginete magnificamente adornado, atravessou as ruas da cidade, com grande escândalo para o povo. Entretanto Deus, em seus insondáveis desígnios, queria servir-se da vaidade de González para impor-lhe uma profunda humilhação. Queria por esse meio levá-lo a melhores sentimentos, fazendo-o sentir quão frívolas e efêmeras são as honras deste mundo.
Chegando à grande praça de Palência, quis fazer seu cavalo corcovear graciosamente, a fim de provocar admiração do público e arrancar-lhe aplausos. Largou o cavalo a toda brida mas, no meio da carreira, o animal empacou de repente, deu um pinote e lançou o cavaleiro no meio da lama. A multidão acolheu a queda com uma estrondosa gargalhada. A vaia foi tremenda. O vaidoso deão, coberto de lama até aos olhos, não ousava levantar-se do chão. Muito salutar foi, todavia, tamanha confusão. Erguendo os olhos ao céu, exclamou: 'Como este mundo, a quem eu desejava agradar, zomba de mim? Pois bem, eu me rirei dele, vou virar-lhe as costas e mudarei de vida'. Abandonou tudo, fez-se dominicano e, com o nome de Frei Telmo, viveu e morreu como santo.
40. A RELIGIÃO MAIS ANTIGA
Na Inglaterra, encontraram-se certa vez um protestante e um católico. Conversa vai, conversa vem, eis que o protestante, para mexer com o outro, perguntou:
➖ O senhor não ficaria triste de ver, depois da sua morte, suas cinzas misturadas na sepultura com as desses homens que o senhor considera hereges?
➖ Não, senhor - respondeu o católico - sabe por que? No meu testamento ordenarei que cavem a minha sepultura um pouco mais funda e, assim, minhas cinzas ficarão misturadas com as de outros católicos.
41. QUANTO VALE A ALMA
Vós, os que vendeis vossa alma por um nada (por um prazer momentâneo, pelas riquezas perecíveis, pelo fumo de uma honra vã, etc), quereis saber o que ela vale? Não vo-lo direi eu; dir-vos-á um pobre índio que viveu nas florestas, mas teve a sorte de conhecer e abraçar a verdade católica.
Morrera então o Padre Smedt; morrera, como São Francisco Xavier, com o braço cansado de batizar pagãos e rodeado de uma coroa gloriosa de novos cristãos. Após a sua morte, penetraram nas selvas, carregados de ouro e de mulheres, uns quantos missionários protestantes. Um deles, metodista, procurou conquistar para a sua seita o chefe da tribo dos yacamas, que havia sido batizado pelo venerável Smedt.
Entre o pastor e o índio entabulou-se então este diálogo:
➖ Quanto você quer para passares para a nossa religião protestante?
➖ Muito dinheiro - respondeu o pele-vermelha.
➖ Quanto? Duzentos dólares?
➖ Muito mais.
➖ Quanto, então? 500.000 dólares?
➖ Muito mais ainda.
➖ Fala, dize a soma que queres e eu a darei.
O índio fitou-o fixamente nos olhos, atirou às costas a sua manta de couro de búfalo e, levantando a mão ao céu, segredou-lhe ao ouvido:
➖ Dai-me o que vale a minha alma!
42. O MATERIALISMO HODIERNO
A geração atual, desprezando os valores do espírito, nenhum interesse mostra pela civilização ou pela cultura. O culto exagerado do corpo manifesta por demais os eczemas da alma. O resultado é o seguinte:
A geração hodierna vê que os jornais dedicam páginas inteiras aos esportes e algumas linhas aos progressos científicos e aos assuntos religiosos. Por esses jornais (e são eles os culpados!), vê-se como um jogador, um campeão de boxe, um astro ou estrela de cinema absorvem por completo a atenção mundial.
Há sábios trabalhando no silêncio de seus gabinetes e ninguém por eles se interessa. Perguntai aos rapazes de hoje onde fica Atenas ou Sidney, Dublin ou Granada, e responderão com indiferença: não sei! Perguntai-lhes, porém, onde está Hollywood e seus olhos brilharão de entusiasmo. Perguntai a um ginasiano quem foi Michelangelo, Pasteur ou Marconi, e ele não saberá; perguntai-lhe quem foi Greta Garbo, Pola Negri ou Rodolfo Valentino e saberão até o dia em que morreram esses tais.
Não sabem a distância que percorre a luz num segundo, mas sabem tudo sobre o recorde de natação da última Olimpíada. Não sabem nem aproximadamente a posição ou a altura do Everest, mas sabem com exatidão os recordes dos saltadores. Não saberão dizer quantos presidentes governaram o Brasil, mas dirão os nomes e a cor dos craques, do Palmeiras ou do Flamengo.
Deixemos, por enquanto, a apreciação dos conhecimentos religiosos desta geração que cresce, porque o ensino religioso nas escolas está mesmo em embrião. O que será, meu Deus, desta geração materializada e sem ideal superior algum?
(Excertos da obra 'Tesouro de Exemplos' - Volume II, do Pe. Francisco Alves, 1960; com adaptações)